HUMBERTO MENEGHIN
Alice Walda me ajudou bastante durante
toda a manhã e mesmo assim eu não acreditava que ela realmente quisesse puxar
meu tapete. Faltando dez minutos para uma da tarde, ela saiu para almoçar junto
com Marinice, aquela secretária de língua afiada que sabia da vida de todos ali
do escritório. Sem fome, fiquei ali frente à tela do meu computador olhando
para a figura pacífica da minha mestra Indianira Shanti Ma, o que me levou a
abrir ao acaso uma das páginas de seu livro “Sabedoria Expressa” que me trouxe
a seguinte mensagem:
“A
felicidade depende só de ti. Se os que estão a tua volta por vezes tentam
desviar-te do caminho, a tua Luz tenderá a perder a intensidade do brilhar. Para
readquirir novamente esse teu brilhar conscientiza que tu és um Ser que não
precisa da aprovação alheia para os deveres que a vida te pede.”
Então, subitamente ouvi um estalo e meu
computador apagou. Tela escura, tentei reiniciar, mas de nada adiantou. Liguei
para o Dárcio que entendia de assuntos ligados à informática e depois de mexer
em alguns fios em baixo da minha mesa, tudo voltou ao normal.
Mesmo que não sentisse muita fome sai
para pelo menos comer um lanche e em poucos minutos já estava na padaria da
chilena. Pedi um sanduíche só com queijo quente e um suco de laranja.
Enquanto aguardava, uma mulher que já
beirava os sessenta, alta, cabelo todo branco e mau cuidado sentou-se ao meu
lado no balcão, dizendo: “Que calor é esse! Tá demais, isso! Não sei onde vamos
parar!”
Concordei com ela e logo que meu lanche
veio, a mulher de cabelo branco pediu um salgado e também um suco. Puxando mais
conversa, resolveu perguntar meu nome, onde eu trabalhava, qual era a minha
idade e se tinha feito faculdade.
Notando que essa mulher parecia ser gente
boa, dei as informações; mas logo depois foi ela quem desatou a falar sobre a
sua vida: “Trabalhei vinte oito anos no banco ... vinte oito anos... a gente
não vê resultado em trabalho de banco ... fiquei com depressão e você sabe que
tem muitos bancários deprimidos? ... Fui uma delas, mas graças a Deus me livrei
da depressão ... a gente tem que pensar positivo ... agora eu estou reformando
a minha casa, tudo novo, sou aposentada, fiz Direito, passei a advogar, tenho
umas causas, sabe? Minha vida era tão vazia, mas dei a volta por cima. Tô
fazendo Yoga, entro em alfa; foi a Yoga que me puxou da depressão ...
Perguntei onde ela estava praticando Yoga,
não revelando que também praticava. Com um sorriso meio amarelo, ela disse:
“Com uma professora muito boa que mora na Vila Industrial. Eu e duas amigas
fazemos Yoga com ela, numa salinha que ela tem nos fundos da casa dela, duas
vezes na semana. A Lili é uma graça, dinâmica, agitada, mas de uma paz que você
não acredita. Quer por que quer que a gente atinja o samadhi. Ela vai pra Índia, sabe? Eu e a minha amiga estamos
pensando seriamente em ir. Já
dei o meu nome pra ela.
Enquanto terminava meu lanche, a senhora
de cabelo branco devorou o salgado de uma só vez e logo em seguida tomou o suco
num gole só, evaporando-o rapidamente do copo.
“Justo! Você tem que fazer uma Yoga com a
gente, moça. Mas a minha aula é no meio da tarde ... Você quer o telefone da
Lili? Eu posso te passar .” E sem esperar resposta aquela mulher retirou um
caderninho da bolsa de couro bem judiada, pegou um daqueles guardanapos fornecidos
pela padaria cujo papel era fino e lá anotou o celular da Lili, aquela
professora estranha que eu já sabia quem era.
E quando me estendeu o guardanapo com o
número, disse: “Anotei meu celular também. Vera Lúcia, Dra. Vera Lúcia.” Com um
brilho nos olhos e acompanhado de um sorriso apagado completou: “ Desculpa de
ter enchido o seu saco. Tenho que ir na prefeitura acertar umas pendências,
IPTU atrasado, sabe?”
Harih
Om!
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