HUMBERTO MENEGHIN
YV
– Antes de você se dedicar à prática e ao estudo do Yoga, seu foco principal
era a massoterapia; como o Yoga surgiu na sua vida? Foi você quem o encontrou
ou foi encontrada?
Juju – Costumo dizer que
fui encontrada, uma coisa de destino, como uma história de amor. Atendia muito
com massagens e sentia fortes dores nas costas e joelhos, então, um dia me
disseram que a solução seria praticar Yoga. Minha melhor amiga, aos seis anos
de idade, tinha uma mãe professora e nós entravamos escondidas na sala de aula,
porque ela não deixava bagunçar o lugar, então, a minha ideia era que, Yoga era
coisa para velhos, porque me lembrava das senhoras de macacão preto entrando na
sala e gente chata porque nós não podíamos brincar na sala acarpetada com
imagens de homem com cabeça de elefante. E mesmo com esse preconceito depois de
tantos anos, resolvi tentar. Nem fazia ideia do que ia encontrar. Tenho que
colocar no altar a pessoa que me indicou.
YV
– Determinada no caminho do Yoga, você foi para a Índia e passou uma
temporada estudando e praticando no Sivananda
Yoga Vedanta Forest Centre, em Rishikesh e lá obteve o título de acharya (mestre) e ainda continuou se
dedicando ao estudo do Vedanta na Divine
Life Society e também com o Swami
Dayananda. De que forma esse background
a inspirou a idealizar o Curso de Filosofia Yogi e a Formação de
Professores na Humaniversidade, em São Paulo?
Juju – O titulo de acharya
eu recebi aqui no Brasil mesmo, com Kanti Devi e o Swami Sivadasananda, que são
discípulos do Swami Vishnu Devananda. Só pra explicar, não é um título de
nobreza ou realeza do Yoga. Qualquer pessoa que faça o curso avançado da escola
Sivananda recebe este certificado.
Bom, depois de passar por muitos cursos de formação e muito aprendizado, notei que não havia nada mais acessível para os que desejam conhecer ou se aprofundar nos estudos e que não podem largar a família ou trabalho para se dedicar com exclusividade viajando a Índia ou retirando-se por um mês, quase não há opções de cursos em doses homeopáticas. Sinto que os retiros são muito mais eficientes, isso não é uma crítica aos que trabalham de forma mais intensiva, mas são poucos os privilegiados que podem ir a um ashram ou tirar um mês de folga da família, trabalho, para viver em comunhão, entende? Então, eu não comecei sozinha, aqui há mais uma coisa de destino. Primeiro, eu iniciei ajudando no curso de formação de um grande amigo, que foi, também, meu professor, Gerson D’Addio, numa fase em que ele sofreu um acidente e precisou se ausentar da sala de aula. Fiquei apavorada, ia substituir meu professor, dá para imaginar? Mas foi um ótimo desafio, pois fui criando segurança em transmitir aquilo que eu havia aprendido.
Assim, fui ficando mais solta para ensinar do meu jeito, e logo, fui convidada a fazer algo com minha cara. Vencido o medo, nasceu esta formação, que na verdade não tem nada de novo, e recebe a influência de todos os que vieram antes de mim, professores, mestres, gurus, sou só mais uma que tenta transmitir aquilo que sabe de forma mais simples. A tradição é perfeita, o Yoga é perfeito, a função do professor é compreender e transmitir o que aprendeu sozinho ou com a ajuda daqueles com quem esteve, então, quis trazer para Sampa a possibilidade do estudo para quem vive preso aqui.
YV
– Você também é formada em Yogaterapia, Hatha
Yoga, Vinyasa Flow e Brahmani Yoga. Como esses estilos podem
se completar um com o outro? Você os adota nas aulas que ministra aos seus
alunos ou no momento está focada em apenas um deles? E, para quem não sabe, o
que é Brahmani Yoga?
Juju
– Tem um erro aqui, Brahmani é o nome da escola de Vinyasa Flow. Não
acredito que os estilos se completem, Yoga já é completo por ele mesmo. Acho só
que eu segui por esse caminho tão diverso porque sou muito curiosa. Você não
faz nem ideia das coisas que já fiz pela iluminação, melhor nem comentar, só
isso já dá uma entrevista longa. E no curso de formação existe uma aula de cada
estilo, Vinyasa, Ashtanga, Yogaterapia, Iyengar, para que os alunos conheçam as
transformações do Hatha Yoga com o tempo e não fiquem confusos com os estilos,
linhas, essas coisas que deixam qualquer iniciante doido.
YV
– Como é a sua prática pessoal? Você acha que se entregar de corpo e alma a
um determinado ásana pode fazer com
que os sentidos se abstraiam de uma forma inesperada para que alguma percepção
marcante venha à tona ou isso não é importante?
Juju
– Minha prática pessoal é sempre adaptável ao que sinto. Trabalho de acordo
com o nível da minha vitalidade. Às vezes faço uma prática que defino “terceira
idade”. Nunca me preocupo com que ásanas vou fazer, com que tipo de meditação
iniciar ou que mantra vou usar. Sou um organismo mutante e preciso avaliar
diariamente quais são os pontos que devo observar. Acho que se você se coloca
de corpo e alma, como você disse, em qualquer atividade, isso é transformador e
trará clareza. Quando piso no meu solo sagrado, aquele lugar de prática, e isso
não é um local físico fixo, pode ser em qualquer lugar que eu defina como
“espaço sagrado”, ali deixo a alma se manifestar, através do movimento, da
fluidez, da respiração consciente e, claro, vai emergir nuances da minha
personalidade que eu devo observar carinhosamente e trabalhar. A meditação é o
ponto essencial de qualquer prática espiritual, que não pode faltar em nenhum
estilo, pois vai criando em nós uma capacidade de atenção focada que nos
permite uma vida mais plena, sem sermos presas das nossas atitudes repetitivas
que causam sofrimento.
YV
– No papel de professora de Yoga, de que modo a prática compromissada da
meditação somado ao conhecimento absorvido do Vedanta contribui para
transformar você e também seus alunos em pessoas mais conscientes?
Juju–
A pratica da meditação possibilita a atenção como já disse antes, traz
clareza e insights profundos em relação as nossas limitações, a nossa
humanidade com seus apegos, medos, prazeres, alegrias e quais os valores que
devemos exercitar com afinco a fim de modificar nossos impulsos automatizados
que nos provocam dor e levam sofrimento aos outros seres.
A história humana é feita de guerras, de invasões, injustiças, e isso está armazenado em nós de alguma forma. Quando presenciamos atos de generosidade, amor espontâneo, isso nos traz emoções fortes, porque reconhecemos ali a capacidade humana da bondade, compaixão, da irmandade e da justiça. Reconhecemos que podemos ser melhores, apesar da cultura, das causas e condições que nos fizeram ser como somos e agir como agimos. Reconhecemos que somos livres de verdade.
A meditação é transparência, oposta a opacidade daquilo que você julga ser, ou faz um esforço danado para provar aos outros que é. Essa lucidez vem acompanhada do estudo, de ver as coisas como elas realmente são e isso é o Vedanta. Este estudo é a resposta as suas questões mais profundas. Minha professora dizia que ‘a prática é um olho, o estudo do Vedanta o outro, para enxergar com perfeição você precisa dos dois’, acho que ela aprendeu isso com o professor dela. A meditação e o estudo caminham juntos.
Costumo perguntar aos alunos que história eles estão escrevendo, que mundo deixarão aos filhos, quais são os valores que eles prezam e assim, acho que promovo dúvidas razoáveis para que haja um questionamento mais apurado e refinado de qual é nossa missão, nosso dharma. Minha atuação é limitada, não sei se consigo torná-los mais conscientes, acho que eles fazem por vontade própria um esforço significativo nessa direção.
YV
– Muitos a conhecem por Juju Priyah.
Quem lhe deu esse nome e o que significa Priyah?
E, em que momento a Juliana Araújo dá lugar à Juju Priyah? Ou a Juju Priyah
está sempre prevalecendo sobre a Juliana Araújo?
Juju – O Juju Priyah é uma
mistura. Meu nome espiritual é Krishna Priyah, aquela que é amada por Krishna e
que recebi do Swami Sivadasananda, da escola Sivananda. Só que há uma
banalização enorme com essa história de nome espiritual, sannyasins, uma
bagunça que, eu vejo sem sentido, sem lógica e razão de ser, posso mudar de
opinião, mas por enquanto é isso que sinto. Então, Juliana Alves de Araujo é
nome de família, Juju o apelido, porque sou a ‘menorzinha’.
Vejo esse nome de uma forma bastante espiritual, porque tem relação com minha ancestralidade e é forte porque, é dos meus antepassados que eu trago todas minhas crenças, não é? É com eles que aprendi muito de bom e de ruim. A escolha de usar Juju Priyah foi por declarar meu respeito e amor às duas famílias, a que me criou e a que eu me adotou, do Yoga.
Vejo esse nome de uma forma bastante espiritual, porque tem relação com minha ancestralidade e é forte porque, é dos meus antepassados que eu trago todas minhas crenças, não é? É com eles que aprendi muito de bom e de ruim. A escolha de usar Juju Priyah foi por declarar meu respeito e amor às duas famílias, a que me criou e a que eu me adotou, do Yoga.
YV
– Seus amigos sabem que você adora gatos, você acha que a convivência com os
felinos te ajuda a exercitar a compaixão? Ou os gatos não estão nem aí com o
que possa significar compaixão?
Juju – Acho que eles me
ensinam muitas coisas, relaxar, brincar bastante, que às vezes você deve parar
o que está fazendo para dar atenção total a uma brincadeira, ou leva uma unhada
daquelas.
Paciência, pois eles serão crianças eternas. Essa história de amizade com os gatos me fez acordar para uma realidade que não conhecia, de que existem muitos bichinhos sem casa e sem carinho. Agora, tenho mais uma função, de ‘dinda felina’, empresto minha casa e meu tempo para cuidar de ‘corações sem lar’, como eu chamo, e busco para eles alguém que tenha amor suficiente para adotá-los. E sempre aparecem muitos gatos e pessoas do bem. Além de tudo que eles ensinam, ajudam a desenvolver compaixão, porque você fica mais sensível a ouvir o sofrimento do mundo, e não olhar só para o próprio umbigo. Se cada indivíduo tomasse para si a responsabilidade de uma ou outra causa nobre, imagina? Crianças, cães, idosos, plantas, tantos seres que precisam de alguém que esteja lá por eles.
YV
– Com qual ou quais Deusas do Panteão Hindu você mais se identifica? Algum
episódio sui generis em relação a uma
deidade Hindu que já a deixou muito surpresa e satisfeita?
Juju– Com Kali, sou
mutável. Vivi transformações muito fortes e radicais, de morte, em ciclos
marcantes. Olho ao meu redor e a vejo atuando lindamente e mostrando a beleza
da transitoriedade de tudo.
YV
– Você tem uma admiração especial por duas mulheres: Frida Kahlo e Monja
Coen. Em que ponto você acha que se parece com elas? E, por analogia, que
Deusas Hindus se afinam mais com a Frida Kahlo e a Monja Coen?
Juju
– A admiração pela Frida é pela quantidade de cores, a capacidade
maravilhosa que ela tinha de pintar a si mesma, por se conhecer muito bem. A
capacidade do sofrimento pessoal ser transformado em arte, da alma se
manifestar de qualquer forma, mesmo que pareça ser impossível, afinal, ela
pintava deitada numa fase da vida, pode imaginar isso? Como arte não é minha preferida,
amo os impressionistas, por exemplo. Mas admiro a mulher, que viveu
intensamente, até vestindo-se como homem.
A monja Coen é
sem comentários. Ela tem uma história de vida linda também e uma busca pela
transcendência admirável. Batalhadora, forte, determinada e zen! Tem uma
sabedoria imensa e sempre um sorriso acolhedor. Adoro essa mistura de ternura e
fortaleza na medida perfeita. Dela eu recebi ensinamentos muito importantes em
diversas fases da vida, ela celebrou meu casamento, e me fez escrever um
juramento perante Buda. Pode imaginar o quanto isso é sério? E o quanto tem que
pensar para não prometer bobagens? Já está na hora de refazer depois de um ano,
porque o casamento é ‘inovar’ em juramentos, uma grande jornada espiritual do
qual ela me iniciou.
Seria pretensão minha achar que me pareço com dois seres que admiro. Posso dizer que já tive dores como da Frida e que usei a força da vontade de seguir adiante, e já fiz muitas coisas erradas até descobrir o Yoga, assim como a Monja Coen até descobrir Buda.
Diria
que a Frida é Kali e a Monja é Shiva, a destruidora da ignorância.
YV
– No Yoga não é raro nos deparáramos com algumas pessoas que extrapolam os
limites do bom senso, seja nas práticas que adotam e ensinam, seja em atos
exageradamente místicos, manipuladores e até mesmo coercitivos. O dito “Se for
viajar na maionese, viaje pela Hellmans
Airlines” se aplica àqueles que confundem os meios e os fins?
Juju
– Engraçado demais isso. Acho que viajar acontece com todo mundo, a não ser
que você tenha nascido como a encarnação de um avatar, não conheço quem não
errou.
O problema é insistir durante muito tempo na maionese,
no erro. O que ensino e vivo hoje é bem diferente do que eu ensinava há anos
atrás, então posso dizer que eu tenho cartão fidelidade da ‘Hellmans airlines’
e conheço vários membros da companhia aérea.
Agora, há uma maturação natural daquilo que aprendemos e vivemos tudo está se transformando, o ensinamento é o mesmo, mas você está crescendo e mudando seu ponto de vista.
Comparo
isso às fases da vida, quando você está engatinhando, sua relação com o mundo é
uma, quando começa a andar, outra. Os que viajam mais são os que estão
engatinhando, mas querem correr na frente dos que já estão até dirigindo,
entende?
Se
você insiste em pular fases naturais do seu crescimento, em fugir da tradição,
ensinar as coisas de forma atrativa, mística, exagerada, da ‘moda’, e essa pode
até ser a jornada da sua alma, nada contra, é bem possível que esteja viajando.
Mas enquanto você viaja, também caminha e uma hora tropeça e cai na estrada
certa. Essa é a beatitude da vida.
O mundo precisa
mais de estudantes dedicados do que de gurus. E vemos pessoas que não saíram do
básico fundamental vendendo a imagem de mestre ou professor. Ensinando de forma
pouco responsável, porque não se deu o tempo certo de amadurecimento daquilo
que recebeu como semente. O que um guru te dá é a semente do ensinamento que
depende da sua terra fértil e do seu cuidado diário para se tornar flor, árvore
frutífera ou morrer se não receber cuidados. Ninguém pode ser culpado pela
ignorância, mas pode ser julgado quando já sabe um pouco e insiste no erro. Aí
reside o problema real de ‘viajar’.
Gosto
de usar o exemplo do Dalai Lama que é mundialmente conhecido, pois muitos
gostariam de ter o conhecimento dele, mas poucos se dispõem a disciplinada vida
monástica e dedicada que ele leva. Então, como isso é possível?
Hoje,
compra-se um livro com frases de grandes filósofos, Koans do budismo, das
tradições orientais e hindus e vemos isso publicado no facebook como se a vida
da pessoa fosse guiada por aquele ensinamento. É pobre, de segunda mão, mas já
é algo.
Eu
sempre confio no tropeço na pedra generosa que vai possibilitar a queda na
estrada certa em algum momento.
E não digo isso
achando que o Yoga é a estrada certa, não sei qual é o caminho alinhado que
serve para cada individuo.
YV
– E por falar em viagem, para onde você gostaria de ir? Retornar à Índia
está em seus planos? Com que propósito? E, para encerrar, quais são as outras
novidades que a Juju Priyah tem para
nos contar?
Juju
– Ultimamente o único lugar que quero estar é na
minha casa em maromba, com meu amor, ouvindo o som das cachoeiras. Estou
revendo essa necessidade de ir e vir, sabe?
Retornar a Índia sempre está nos meus planos. O propósito de lá sempre
será estudo e também rever amigos e um tempinho para passeio, claro. As
novidades é que sempre tenho gatos que precisam de um lar, que abri um espaço
para cultura oriental, meditação, atendimentos terapêuticos, chamado Casa
Prana, que está se desenvolvendo de forma linda, com pessoas que vibram na
mesma sintonia, isso é mágico. Temos atendimentos de massagem com terapeutas
deficientes visuais, espaço para criança, bazar de trocas, festas, cursos de
budismo, ecologia, muitas atividades. È isso.
Agradeço o seu carinho por essa entrevista. E que nós possamos nos encontrar nessa jornada Yogi muitas vezes ainda. Gratidão e amor profundo.
DECLARAÇÕES DE UMA YOGINI PAULISTA: COMO SOBREVIVER AO
TRÂNSITO
JULIANA ARAÚJO
artigo publicado originalmente no www.yoga.pro.br
Somos a décima quarta cidade mais globalizada do planeta com 20
milhões de habitantes, o que nos torna a sexta maior aglomeração de pessoas no
mundo. Conhecida como terra da garoa, tem como lema na sua bandeira a
frase 'Não sou conduzido, conduzo.'
Agora, imagine esse monte de gente tentando conduzir cada um o seu
próprio veículo até o trabalho ou escola diariamente.
É exatamente o que você presencia nos jornais, uma bagunça, um
Deus nos acuda e um cenário dos mais aterrorizantes e desgastantes.
Às vezes, muitos de nós nos perguntamos: 'o que estou
fazendo aqui?' ou 'o que levaria uma pessoa a passar a vida
num escritório com algumas poucas horas de descanso para almoçar em locais
lotados e barulhentos?' Ou ainda, 'porque alguém passaria tanto
tempo num carro todos os dias da sua vida adulta?'
Cada um com suas questões existenciais e razões, caminhamos
(vagarosamente) por largas avenidas, na cidade da qual colhemos boas lições de
vida.
Viver num lugar com tanta gente faz com que você seja o rei da
paciência, ou se não for, que sofra muito com a falta da mesma, pois você
espera por tudo. Aguarda uma vaga no estacionamento e também por uma mesa num
restaurante, espera o metrô ou ônibus mais vazio e espera também, um dia,
mudar-se dali, pois o sonho da grande maioria é comprar uma casa no interior ou
na praia para, no futuro, obter o merecido descanso.
Esperamos, também, pela felicidade. Aquela que está lá (não aqui),
depois de anos de trabalho duro. Paulistanos, a maioria vive para
trabalhar/produzir/gastar e somos constantemente estimulados por propagandas
que nos levam a consumir tanto que acabamos nos consumindo.
Vivemos, todos, no mundo dos desejos fáceis e acessíveis com taxas
mínimas de 10 por cento ao mês. Estamos sempre correndo atrás de nossos desejos
e trabalhamos somente para realizá-los. Desejamos um carro, juntamos uma grana,
compramos e não conseguimos ser felizes dentro dele. (E isso serve para tudo)
Uma das razões do nosso sofrimento é o trânsito. O ritmo das
idéias de como melhorar este problema não acompanha o fluxo de carros sendo
colocados diariamente nas ruas.
São Paulo vive em constante obra procurando crescer para onde não
há mais espaço com a intenção de atender aos desejos dos habitantes e suportar
a quantidade absurda de automóveis; reformas que pioram ainda mais a qualidade
da vida da galera porque a bagunça e o barulho tomam conta.
O que pode ser feito? O ritmo estressante vai parar ou sou eu que
devo mudar minhas atitudes e maneira de ver o mundo? É possível ser feliz em
meio a tanta gente e tanta bagunça? Queremos respostas que nos
satisfaçam.
Busco as minhas no Yoga. Não na prática de exercícios e das
técnicas, ficando de cabeça para baixo, ou fazendo Om quando rola uma passeata na paulista
(apesar de isso ajudar bem), mas, em todas as possíveis vertentes desse
sistema. Veja como podemos trazer ensinamentos milenares para nossa vida.
Um exemplo bem legal vem lá de uma conversinha que Nachiketas tem
com a morte na Katha Upanisad,
um texto bem velhinho cheio de sabedoria, daquelas que servem para qualquer
cidadão de qualquer nação ou religião. AKatha Upanisad data de 1000 AC e pertence ao Yajur Veda, um dos quatro
livros de sabedoria da cultura hindu. O menino vai ao inferno e quer esclarecer
algumas dúvidas e Yamah, a morte, dá uma lição de sabedoria.
Ela responde: "qual é a verdadeira morada da
felicidade?" e dá ao garoto um mapa do tesouro. Tesouro? Sim. Porque você
vai chegar num lugar que é pura riqueza, onde trânsito ou chefe nenhum acaba
com seu dia. Algumas pessoas ao ouvir falar de um lugar assim, já se imaginam
morando num condomínio de luxo chamado 'Residencial Morada da Plenitude. '
Yamah diz que o Ser, aquilo pelo qual tudo existe e que é a coisinha
que buscamos, é o senhor de uma carruagem realizando uma jornada. O nosso corpo
é a própria carruagem. O discernimento é o cocheiro e a mente as rédeas. Os
sentidos são os cavalos e as estradas que eles percorrem os labirintos do
desejo. E que quando a gente se confunde, tipo achando que é o corpo, a mente
ou os sentidos vem o sofrimento.
Trocamos nossos carros, compramos sem parar, fazemos
tratamentos estéticos, para preencher o vazio de não sabermos quem somos,
porque estamos identificados com a carruagem, os cavalos, as rédeas, etc. Nós
olhamos a periferia achando que é o centro. Vivemos, então, para acariciar
nossos cavalos.
Claro que como o texto é bem antigo, a morte não fala assim que
buscamos a felicidade no botox, num carro novo ou num relacionamento, mas estou
trazendo aqui para minha realidade.
Demais, não é? E o que tem a ver isso com viver em Sampa ou com
nossa vida? Oras bolas, tudo! Vivo num lugar onde todos querem algo diferente
do que é. Se chover é comum dizerem 'Xi, vai alagar a cidade toda, bem que
essa chuva podia parar'. Se fizer sol é 'ninguém merece
trabalhar com um tempo assim, a cidade fica abafada, tenho alergia ao ar condicionado' e
assim por diante. Sempre queremos o que não é. E isso em relação aos fenômenos
da natureza, imagine com o resto!
E o trânsito, então? Loucura! O desejo é chegar, claro!
Dentro do carro dá tempo de ficar se lamentando e reclamando de todas as
injustiças do mundo, ou seja, todas as injustiças comigo.
Penso até que se Nachiketas estivesse ali na vinte e três de maio
às 17 horas ia achar que inferno é um spa.
Percebo que há um euzinho que é totalmente dominado pelos cavalos
dos gostos e aversões. Que se revolta, grita e esperneia com a situação. Quero
estar em algum lugar, não onde estou! Eu quero sentir-me bem! Quero
chegar á ________ (e aqui você pode preencher o espaço em branco com
o que você preferir) e então, me deleitar de prazer e felicidade. Desejo estar
na minha casa, na minha cama ou comendo minha sopinha e estar no carro me frustra.
Quando olho para essa situação, algo me diz que não há engarrafamento que dure
para sempre. Será o cocheiro?
Seria muito mais sábio exercitar a acomodação (kshanti),
liberando-se das expectativas e vivendo o momento. Aproveitar a música,
usufruir o confortável banco do carro.
Não há como evitar o inevitável, são milhares de quilômetros de
congestionamento. Se eu me perguntar qual a razão para tal sofrimento, vou
notar o ridículo da situação. Lembro-me de mais uma coisa que serve
para este momento Ashotya- um probleminha tão pequeno que nem merece muita
atenção. E essa sabedoria vem lá de um ensinamento de Krishna, o cara que sabia
muito de tudo.
Procurar soluções para se viver melhor é nosso direito e nossa
liberdade. Sou a favor de mais bikes pela cidade. Mas quando me noto desejando
o mundo perfeito, discursando que devemos abandonar os carros, o cocheiro me dá
aquela puxadinha nas rédeas e os cavalos freiam. A única perfeição que existe
esta além das coisas que vem e vão, outro ensinamento da Dona Morte.
Numa parte do Katha Upanisad ela oferece para o menino, mulheres,
carrões, conta bancária bem gorda, apartamento de frente para o mar, casa de
campo com piscina, isenção de impostos, vidão de astro de futebol, em troca,
claro, do conhecimento sobre ele mesmo que era o que ele tinha ido buscar. Ela
não fala bem assim, mas deu para pegar, não é?
A luta cotidiana é para um dia ser feliz e, para alguns, famoso
também, como a pessoa que aparece sorridente na capa da revista numa ilha, num
castelo ou no carrão naquele mundo de perfeição!
Imagina, então, Yamah te oferecendo tudo isso assim, de mão
beijada, é difícil de recusar.
A danada está testando o garoto acariciando os cavalos dele,
oferecendo uma estrada bem legal para que eles possam trotar felizes. As rédeas
começam a se afrouxar com tanta gentileza. O cocheiro tem que ser forte e
atento. Momento decisivo.
Se você tem um pouco de maturidade, já deve ter notado que vivemos
para conquistar a casa de praia/ campo/_________(preencha com o que quiser) e
assim que chegamos lá e estamos olhando o mar, já começamos a pensar qual será
próxima conquista.
Logo em seguida queremos outra coisa que está mais lá na frente.
Sampa tem um shopping a cada bairro, uma loja super hiper demais em cada
pedacinho da cidade, comidinhas e bebidinhas sem fim, bares da moda e muito
mais de tudo para seduzir os cavalos. É a tal da estrada dos desejos. Não há um
espaço que não venda a urgência de ser feliz.
Não estou aqui falando que o desejo é o mal do mundo e nem para
levantar a bandeira do 'vamos acabar com esse demônio', porque ele também te
move a agir, à promover grandes mudanças e fazer diferença nesse mundo de
coisas mutáveis.
E não há possibilidade de que ele deixe de existir. Só que podemos
ser um pouco mais inteligentes e perceber que não tem jeito mesmo das coisas
serem como queremos. Que o discernimento tem que conduzir com as rédeas firmes
para que a carruagem não saia se quebrando toda por ai, sofrendo, ralando e
sentindo-se um bagaço. Rédeas frouxas quem manda são os cavalos. E eles te
conduzem para onde bem entender.
A dica para quem sofre com o trânsito é não seja conduzido, conduza sua
própria carruagem com sabedoria. Se você fizer isso, pode até pensar em deixar
o carro em casa, de vez em quando, e curtir o visual da cidade em cima de uma
bicicleta ou andando. Garanto que vale a pena!
JULIANA ARAÚJO - JUJU PRIYAH - Yogini por Amor + instrutora por dedicação + massoterapeuta por vocação + caminhando com samtosha e exercitando compaixão, escreve e edita o blog http://jujupriyahumaniversidade.blogspot.com.br/
JULIANA ARAÚJO - JUJU PRIYAH - Yogini por Amor + instrutora por dedicação + massoterapeuta por vocação + caminhando com samtosha e exercitando compaixão, escreve e edita o blog http://jujupriyahumaniversidade.blogspot.com.br/
A Juju é demais...uma pessoa do bem!
ResponderExcluirBjsss e linda entrevista!
Amado...agradeço muito o carinho!
ExcluirA cara dela!Ela é essa mistura toda, mais um pouco!! Amada, amiga, mestra, professora, sempre, gratidão.
ResponderExcluirEssa mistura toda e mais um pouco? Ai que medo!!!amiga querida,gratidão, gratidão....
ExcluirEla é iluminada, né.
ResponderExcluirdani, respondi lá embaixo, eu que sei tudo de computador...hahahahahaha
ExcluirDesculpe Juliana, mas queria saber porque ainda transmitem o Sannya para tanta gente se existe esse pensamento no ar?
ResponderExcluiroi anônimo, não faço idéia, mas pensamento no ar não é nada,né? Fica lá um tempo e desaparece. Na entrevista, abri o que eu, indivíduo, penso a respeito desse assunto agora. E deixei claro que posso mudar de idéia, principalmente se alguém me apresentar algo verdadeiro sobre isso. Só posso falar sobre as minhas ações.Há muitas opiniões diferentes e pontos de vista também.Para alguns pode ser que seja muito importante ter um nome com significado, ainda mais, se você não gostar do seu nome de registro (não contive a gargalhada). Há muitos distribuindo sannyas porque foi isso que o mestre espiritual deles ensinou, eu acho. E porque tem pessoas que desejam ter um nome. Simples assim. Espero ter ajudado. Que você esteja em paz! Agradeço sua pergunta!
ResponderExcluiroi Daniela Hayashi...vai parecer piegas, mas é isso mesmo...dizem que só vemos no outro nosso reflexo...Amor e gratidão!
ResponderExcluirEntrevista excelente, texto inspirador. Gratidão por existir, Juju.
ResponderExcluir_/\_ grata! ;)
ExcluirVer tuas fotos e ler tuas palavras me trouxe a minha memória a beleza transcendente que emana dos pés de lótus de Krisna.Vc é muito amada por Ele e somos Um em Seu amor infinito.Namastê,André.
ResponderExcluirAndre, suas palavras sao muito generosas. Sinto realmente que somos todos amados por Ele. Gratidao! _/\_
ExcluirVc tá me devendo um japa mala, promessa é divida.Fico muito feliz te ver satiam shivam sundaram,verdadeiramente linda e abençoada.Namastê,André.
ExcluirOi Andre..te devendo um japa mala? jura? perai...desde quando??hahahahaha...me ajuda aqui, quem e voce? Andre, o Yogi-medico-pai do Sidharta? Se for voce, sim eu to em divida contigo ha bastante tempo!!! _/\_Om Tat Sat!!!!
ExcluirA roda da vida girou e nos encontramos novamente.Engraçado que acabei de voltar da India e pensei em vc lá.Ishwara Pranidhana,confie no Universo.Agora que estamos prontos que tal nos revermos? André Pacheco
ExcluirCom enorme gratidao...encontrou Babaji???vamos la, escreva no meu email seu contato...neelamagaya@gmail.com te entrego o japa mala e conversamos sobre nossas viagens!!!Sera um enorme prazer recebe-lo em casa, grande yogi!!!!um super abraco pra sua familia..
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPalavras firmes, esclarecedoras e cheias desse amor maravilhoso!Harih Om!_/\_
ResponderExcluirMinha Professora!!!__/\__!!Maravilhosa!!!
ResponderExcluir