10 de setembro de 2012

YOGA EM VOGA ENTREVISTA – JULIANA ARAÚJO, “JUJU PRIYAH”





HUMBERTO MENEGHIN


YVAntes de você se dedicar à prática e ao estudo do Yoga, seu foco principal era a massoterapia; como o Yoga surgiu na sua vida? Foi você quem o encontrou ou foi encontrada?

JujuCostumo dizer que fui encontrada, uma coisa de destino, como uma história de amor. Atendia muito com massagens e sentia fortes dores nas costas e joelhos, então, um dia me disseram que a solução seria praticar Yoga. Minha melhor amiga, aos seis anos de idade, tinha uma mãe professora e nós entravamos escondidas na sala de aula, porque ela não deixava bagunçar o lugar, então, a minha ideia era que, Yoga era coisa para velhos, porque me lembrava das senhoras de macacão preto entrando na sala e gente chata porque nós não podíamos brincar na sala acarpetada com imagens de homem com cabeça de elefante. E mesmo com esse preconceito depois de tantos anos, resolvi tentar. Nem fazia ideia do que ia encontrar. Tenho que colocar no altar a pessoa que me indicou.



YVDeterminada no caminho do Yoga, você foi para a Índia e passou uma temporada estudando e praticando no Sivananda Yoga Vedanta Forest Centre, em Rishikesh e lá obteve o título de acharya (mestre) e ainda continuou se dedicando ao estudo do Vedanta na Divine Life Society e também com o Swami Dayananda. De que forma esse background a inspirou a idealizar o Curso de Filosofia Yogi e a Formação de Professores na Humaniversidade, em São Paulo?

Juju O titulo de acharya eu recebi aqui no Brasil mesmo, com Kanti Devi e o Swami Sivadasananda, que são discípulos do Swami Vishnu Devananda. Só pra explicar, não é um título de nobreza ou realeza do Yoga. Qualquer pessoa que faça o curso avançado da escola Sivananda recebe este certificado.

Bom, depois de passar por muitos cursos de formação e muito aprendizado, notei que não havia nada mais acessível para os que desejam conhecer ou se aprofundar nos estudos e que não podem largar a família ou trabalho para se dedicar com exclusividade viajando a Índia ou retirando-se por um mês, quase não há opções de cursos em doses homeopáticas. Sinto que os retiros são muito mais eficientes, isso não é uma crítica aos que trabalham de forma mais intensiva, mas são poucos os privilegiados que podem ir a um ashram ou tirar um mês de folga da família, trabalho, para viver em comunhão, entende? Então, eu não comecei sozinha, aqui há mais uma coisa de destino. Primeiro, eu iniciei ajudando no curso de formação de um grande amigo, que foi, também, meu professor, Gerson D’Addio, numa fase em que ele sofreu um acidente e precisou se ausentar da sala de aula. Fiquei apavorada, ia substituir meu professor, dá para imaginar? Mas foi um ótimo desafio, pois fui criando segurança em transmitir aquilo que eu havia aprendido. 

Assim, fui ficando mais solta para ensinar do meu jeito, e logo, fui convidada a fazer algo com minha cara. Vencido o medo, nasceu esta formação, que na verdade não tem nada de novo, e recebe a influência de todos os que vieram antes de mim, professores, mestres, gurus, sou só mais uma que tenta transmitir aquilo que sabe de forma mais simples. A tradição é perfeita, o Yoga é perfeito, a função do professor é compreender e transmitir o que aprendeu sozinho ou com a ajuda daqueles com quem esteve, então, quis trazer para Sampa a possibilidade do estudo para quem vive preso aqui.



YVVocê também é formada em Yogaterapia, Hatha Yoga, Vinyasa Flow e Brahmani Yoga. Como esses estilos podem se completar um com o outro? Você os adota nas aulas que ministra aos seus alunos ou no momento está focada em apenas um deles? E, para quem não sabe, o que é Brahmani Yoga?

JujuTem um erro aqui, Brahmani é o nome da escola de Vinyasa Flow. Não acredito que os estilos se completem, Yoga já é completo por ele mesmo. Acho só que eu segui por esse caminho tão diverso porque sou muito curiosa. Você não faz nem ideia das coisas que já fiz pela iluminação, melhor nem comentar, só isso já dá uma entrevista longa. E no curso de formação existe uma aula de cada estilo, Vinyasa, Ashtanga, Yogaterapia, Iyengar, para que os alunos conheçam as transformações do Hatha Yoga com o tempo e não fiquem confusos com os estilos, linhas, essas coisas que deixam qualquer iniciante doido.




YVComo é a sua prática pessoal? Você acha que se entregar de corpo e alma a um determinado ásana pode fazer com que os sentidos se abstraiam de uma forma inesperada para que alguma percepção marcante venha à tona ou isso não é importante?

JujuMinha prática pessoal é sempre adaptável ao que sinto. Trabalho de acordo com o nível da minha vitalidade. Às vezes faço uma prática que defino “terceira idade”. Nunca me preocupo com que ásanas vou fazer, com que tipo de meditação iniciar ou que mantra vou usar. Sou um organismo mutante e preciso avaliar diariamente quais são os pontos que devo observar. Acho que se você se coloca de corpo e alma, como você disse, em qualquer atividade, isso é transformador e trará clareza. Quando piso no meu solo sagrado, aquele lugar de prática, e isso não é um local físico fixo, pode ser em qualquer lugar que eu defina como “espaço sagrado”, ali deixo a alma se manifestar, através do movimento, da fluidez, da respiração consciente e, claro, vai emergir nuances da minha personalidade que eu devo observar carinhosamente e trabalhar. A meditação é o ponto essencial de qualquer prática espiritual, que não pode faltar em nenhum estilo, pois vai criando em nós uma capacidade de atenção focada que nos permite uma vida mais plena, sem sermos presas das nossas atitudes repetitivas que causam sofrimento.




YVNo papel de professora de Yoga, de que modo a prática compromissada da meditação somado ao conhecimento absorvido do Vedanta contribui para transformar você e também seus alunos em pessoas mais conscientes?

JujuA pratica da meditação possibilita a atenção como já disse antes, traz clareza e insights profundos em relação as nossas limitações, a nossa humanidade com seus apegos, medos, prazeres, alegrias e quais os valores que devemos exercitar com afinco a fim de modificar nossos impulsos automatizados que nos provocam dor e levam sofrimento aos outros seres.

A história humana é feita de guerras, de invasões, injustiças, e isso está armazenado em nós de alguma forma. Quando presenciamos atos de generosidade, amor espontâneo, isso nos traz emoções fortes, porque reconhecemos ali a capacidade humana da bondade, compaixão, da irmandade e da justiça. Reconhecemos que podemos ser melhores, apesar da cultura, das causas e condições que nos fizeram ser como somos e agir como agimos. Reconhecemos que somos livres de verdade.

A meditação é transparência, oposta a opacidade daquilo que você julga ser, ou faz um esforço danado para provar aos outros que é. Essa lucidez vem acompanhada do estudo, de ver as coisas como elas realmente são e isso é o Vedanta. Este estudo é a resposta as suas questões mais profundas. Minha professora dizia que ‘a prática é um olho, o estudo do Vedanta o outro, para enxergar com perfeição você precisa dos dois’, acho que ela aprendeu isso com o professor dela. A meditação e o estudo caminham juntos.

Costumo perguntar aos alunos que história eles estão escrevendo, que mundo deixarão aos filhos, quais são os valores que eles prezam e assim, acho que promovo dúvidas razoáveis para que haja um questionamento mais apurado e refinado de qual é nossa missão, nosso dharma. Minha atuação é limitada, não sei se consigo torná-los mais conscientes, acho que eles fazem por vontade própria um esforço significativo nessa direção.




YVMuitos a conhecem por Juju Priyah. Quem lhe deu esse nome e o que significa Priyah? E, em que momento a Juliana Araújo dá lugar à Juju Priyah? Ou a Juju Priyah está sempre prevalecendo sobre a Juliana Araújo?

JujuO Juju Priyah é uma mistura. Meu nome espiritual é Krishna Priyah, aquela que é amada por Krishna e que recebi do Swami Sivadasananda, da escola Sivananda. Só que há uma banalização enorme com essa história de nome espiritual, sannyasins, uma bagunça que, eu vejo sem sentido, sem lógica e razão de ser, posso mudar de opinião, mas por enquanto é isso que sinto. Então, Juliana Alves de Araujo é nome de família, Juju o apelido, porque sou a ‘menorzinha’. 

Vejo esse nome de uma forma bastante espiritual, porque tem relação com minha ancestralidade e é forte porque, é dos meus antepassados que eu trago todas minhas crenças, não é? É com eles que aprendi muito de bom e de ruim. A escolha de usar Juju Priyah foi por declarar meu respeito e amor às duas famílias, a que me criou e a que eu me adotou, do Yoga.




YVSeus amigos sabem que você adora gatos, você acha que a convivência com os felinos te ajuda a exercitar a compaixão? Ou os gatos não estão nem aí com o que possa significar compaixão?

JujuAcho que eles me ensinam muitas coisas, relaxar, brincar bastante, que às vezes você deve parar o que está fazendo para dar atenção total a uma brincadeira, ou leva uma unhada daquelas.

Paciência, pois eles serão crianças eternas. Essa história de amizade com os gatos me fez acordar para uma realidade que não conhecia, de que existem muitos bichinhos sem casa e sem carinho. Agora, tenho mais uma função, de ‘dinda felina’, empresto minha casa e meu tempo para cuidar de ‘corações sem lar’, como eu chamo, e busco para eles alguém que tenha amor suficiente para adotá-los. E sempre aparecem muitos gatos e pessoas do bem. Além de tudo que eles ensinam, ajudam a desenvolver compaixão, porque você fica mais sensível a ouvir o sofrimento do mundo, e não olhar só para o próprio umbigo. Se cada indivíduo tomasse para si a responsabilidade de uma ou outra causa nobre, imagina? Crianças, cães, idosos, plantas, tantos seres que precisam de alguém que esteja lá por eles.

YVCom qual ou quais Deusas do Panteão Hindu você mais se identifica? Algum episódio sui generis em relação a uma deidade Hindu que já a deixou muito surpresa e satisfeita?

JujuCom Kali, sou mutável. Vivi transformações muito fortes e radicais, de morte, em ciclos marcantes. Olho ao meu redor e a vejo atuando lindamente e mostrando a beleza da transitoriedade de tudo.




YVVocê tem uma admiração especial por duas mulheres: Frida Kahlo e Monja Coen. Em que ponto você acha que se parece com elas? E, por analogia, que Deusas Hindus se afinam mais com a Frida Kahlo e a Monja Coen?

JujuA admiração pela Frida é pela quantidade de cores, a capacidade maravilhosa que ela tinha de pintar a si mesma, por se conhecer muito bem. A capacidade do sofrimento pessoal ser transformado em arte, da alma se manifestar de qualquer forma, mesmo que pareça ser impossível, afinal, ela pintava deitada numa fase da vida, pode imaginar isso? Como arte não é minha preferida, amo os impressionistas, por exemplo. Mas admiro a mulher, que viveu intensamente, até vestindo-se como homem.




A monja Coen é sem comentários. Ela tem uma história de vida linda também e uma busca pela transcendência admirável. Batalhadora, forte, determinada e zen! Tem uma sabedoria imensa e sempre um sorriso acolhedor. Adoro essa mistura de ternura e fortaleza na medida perfeita. Dela eu recebi ensinamentos muito importantes em diversas fases da vida, ela celebrou meu casamento, e me fez escrever um juramento perante Buda. Pode imaginar o quanto isso é sério? E o quanto tem que pensar para não prometer bobagens? Já está na hora de refazer depois de um ano, porque o casamento é ‘inovar’ em juramentos, uma grande jornada espiritual do qual ela me iniciou.

Seria pretensão minha achar que me pareço com dois seres que admiro. Posso dizer que já tive dores como da Frida e que usei a força da vontade de seguir adiante, e já fiz muitas coisas erradas até descobrir o Yoga, assim como a Monja Coen até descobrir Buda.
Diria que a Frida é Kali e a Monja é Shiva, a destruidora da ignorância.




YVNo Yoga não é raro nos deparáramos com algumas pessoas que extrapolam os limites do bom senso, seja nas práticas que adotam e ensinam, seja em atos exageradamente místicos, manipuladores e até mesmo coercitivos. O dito “Se for viajar na maionese, viaje pela Hellmans Airlines” se aplica àqueles que confundem os meios e os fins?

JujuEngraçado demais isso. Acho que viajar acontece com todo mundo, a não ser que você tenha nascido como a encarnação de um avatar, não conheço quem não errou.
O problema é insistir durante muito tempo na maionese, no erro. O que ensino e vivo hoje é bem diferente do que eu ensinava há anos atrás, então posso dizer que eu tenho cartão fidelidade da ‘Hellmans airlines’ e conheço vários membros da companhia aérea.

Agora, há uma maturação natural daquilo que aprendemos e vivemos tudo está se transformando, o ensinamento é o mesmo, mas você está crescendo e mudando seu ponto de vista.

Comparo isso às fases da vida, quando você está engatinhando, sua relação com o mundo é uma, quando começa a andar, outra. Os que viajam mais são os que estão engatinhando, mas querem correr na frente dos que já estão até dirigindo, entende?

Se você insiste em pular fases naturais do seu crescimento, em fugir da tradição, ensinar as coisas de forma atrativa, mística, exagerada, da ‘moda’, e essa pode até ser a jornada da sua alma, nada contra, é bem possível que esteja viajando. Mas enquanto você viaja, também caminha e uma hora tropeça e cai na estrada certa. Essa é a beatitude da vida.

O mundo precisa mais de estudantes dedicados do que de gurus. E vemos pessoas que não saíram do básico fundamental vendendo a imagem de mestre ou professor. Ensinando de forma pouco responsável, porque não se deu o tempo certo de amadurecimento daquilo que recebeu como semente. O que um guru te dá é a semente do ensinamento que depende da sua terra fértil e do seu cuidado diário para se tornar flor, árvore frutífera ou morrer se não receber cuidados. Ninguém pode ser culpado pela ignorância, mas pode ser julgado quando já sabe um pouco e insiste no erro. Aí reside o problema real de ‘viajar’.

Gosto de usar o exemplo do Dalai Lama que é mundialmente conhecido, pois muitos gostariam de ter o conhecimento dele, mas poucos se dispõem a disciplinada vida monástica e dedicada que ele leva. Então, como isso é possível?
Hoje, compra-se um livro com frases de grandes filósofos, Koans do budismo, das tradições orientais e hindus e vemos isso publicado no facebook como se a vida da pessoa fosse guiada por aquele ensinamento. É pobre, de segunda mão, mas já é algo.

Eu sempre confio no tropeço na pedra generosa que vai possibilitar a queda na estrada certa em algum momento.
E não digo isso achando que o Yoga é a estrada certa, não sei qual é o caminho alinhado que serve para cada individuo.




 YVE por falar em viagem, para onde você gostaria de ir? Retornar à Índia está em seus planos? Com que propósito? E, para encerrar, quais são as outras novidades que a Juju Priyah tem para nos contar?

Juju Ultimamente o único lugar que quero estar é na minha casa em maromba, com meu amor, ouvindo o som das cachoeiras. Estou revendo essa necessidade de ir e vir, sabe?  Retornar a Índia sempre está nos meus planos. O propósito de lá sempre será estudo e também rever amigos e um tempinho para passeio, claro. As novidades é que sempre tenho gatos que precisam de um lar, que abri um espaço para cultura oriental, meditação, atendimentos terapêuticos, chamado Casa Prana, que está se desenvolvendo de forma linda, com pessoas que vibram na mesma sintonia, isso é mágico. Temos atendimentos de massagem com terapeutas deficientes visuais, espaço para criança, bazar de trocas, festas, cursos de budismo, ecologia, muitas atividades. È isso.

Agradeço o seu carinho por essa entrevista. E que nós possamos nos encontrar nessa jornada Yogi muitas vezes ainda. Gratidão e amor profundo.





DECLARAÇÕES DE UMA YOGINI PAULISTA: COMO SOBREVIVER AO TRÂNSITO




JULIANA ARAÚJO
artigo publicado originalmente no www.yoga.pro.br


Somos a décima quarta cidade mais globalizada do planeta com 20 milhões de habitantes, o que nos torna a sexta maior aglomeração de pessoas no mundo. Conhecida como terra da garoa, tem como lema na sua bandeira a frase 'Não sou conduzido, conduzo.'
Agora, imagine esse monte de gente tentando conduzir cada um o seu próprio veículo até o trabalho ou escola diariamente.
É exatamente o que você presencia nos jornais, uma bagunça, um Deus nos acuda e um cenário dos mais aterrorizantes e desgastantes.
Às vezes, muitos de nós nos perguntamos: 'o que estou fazendo aqui?' ou 'o que levaria uma pessoa a passar a vida num escritório com algumas poucas horas de descanso para almoçar em locais lotados e barulhentos?' Ou ainda, 'porque alguém passaria tanto tempo num carro todos os dias da sua vida adulta?'
Cada um com suas questões existenciais e razões, caminhamos (vagarosamente) por largas avenidas, na cidade da qual colhemos boas lições de vida.
Viver num lugar com tanta gente faz com que você seja o rei da paciência, ou se não for, que sofra muito com a falta da mesma, pois você espera por tudo. Aguarda uma vaga no estacionamento e também por uma mesa num restaurante, espera o metrô ou ônibus mais vazio e espera também, um dia, mudar-se dali, pois o sonho da grande maioria é comprar uma casa no interior ou na praia para, no futuro, obter o merecido descanso.
Esperamos, também, pela felicidade. Aquela que está lá (não aqui), depois de anos de trabalho duro. Paulistanos, a maioria vive para trabalhar/produzir/gastar e somos constantemente estimulados por propagandas que nos levam a consumir tanto que acabamos nos consumindo.
Vivemos, todos, no mundo dos desejos fáceis e acessíveis com taxas mínimas de 10 por cento ao mês. Estamos sempre correndo atrás de nossos desejos e trabalhamos somente para realizá-los. Desejamos um carro, juntamos uma grana, compramos e não conseguimos ser felizes dentro dele. (E isso serve para tudo)
Uma das razões do nosso sofrimento é o trânsito. O ritmo das idéias de como melhorar este problema não acompanha o fluxo de carros sendo colocados diariamente nas ruas.
São Paulo vive em constante obra procurando crescer para onde não há mais espaço com a intenção de atender aos desejos dos habitantes e suportar a quantidade absurda de automóveis; reformas que pioram ainda mais a qualidade da vida da galera porque a bagunça e o barulho tomam conta.



O que pode ser feito? O ritmo estressante vai parar ou sou eu que devo mudar minhas atitudes e maneira de ver o mundo? É possível ser feliz em meio a tanta gente e tanta bagunça? Queremos respostas que nos satisfaçam.  
Busco as minhas no Yoga. Não na prática de exercícios e das técnicas, ficando de cabeça para baixo, ou fazendo Om quando rola uma passeata na paulista (apesar de isso ajudar bem), mas, em todas as possíveis vertentes desse sistema. Veja como podemos trazer ensinamentos milenares para nossa vida.
Um exemplo bem legal vem lá de uma conversinha que Nachiketas tem com a morte na Katha Upanisad, um texto bem velhinho cheio de sabedoria, daquelas que servem para qualquer cidadão de qualquer nação ou religião. AKatha Upanisad data de 1000 AC e pertence ao Yajur Veda, um dos quatro livros de sabedoria da cultura hindu. O menino vai ao inferno e quer esclarecer algumas dúvidas e Yamah, a morte, dá uma lição de sabedoria.
Ela responde: "qual é a verdadeira morada da felicidade?" e dá ao garoto um mapa do tesouro. Tesouro? Sim. Porque você vai chegar num lugar que é pura riqueza, onde trânsito ou chefe nenhum acaba com seu dia. Algumas pessoas ao ouvir falar de um lugar assim, já se imaginam morando num condomínio de luxo chamado 'Residencial Morada da Plenitude. '
Yamah diz que o Ser, aquilo pelo qual tudo existe e que é a coisinha que buscamos, é o senhor de uma carruagem realizando uma jornada. O nosso corpo é a própria carruagem. O discernimento é o cocheiro e a mente as rédeas. Os sentidos são os cavalos e as estradas que eles percorrem os labirintos do desejo. E que quando a gente se confunde, tipo achando que é o corpo, a mente ou os sentidos vem o sofrimento.
Trocamos nossos carros, compramos sem parar, fazemos tratamentos estéticos, para preencher o vazio de não sabermos quem somos, porque estamos identificados com a carruagem, os cavalos, as rédeas, etc. Nós olhamos a periferia achando que é o centro. Vivemos, então, para acariciar nossos cavalos.
Claro que como o texto é bem antigo, a morte não fala assim que buscamos a felicidade no botox, num carro novo ou num relacionamento, mas estou trazendo aqui para minha realidade. 
Demais, não é? E o que tem a ver isso com viver em Sampa ou com nossa vida? Oras bolas, tudo! Vivo num lugar onde todos querem algo diferente do que é. Se chover é comum dizerem 'Xi, vai alagar a cidade toda, bem que essa chuva podia parar'. Se fizer sol é 'ninguém merece trabalhar com um tempo assim, a cidade fica abafada, tenho alergia ao ar condicionado' e assim por diante. Sempre queremos o que não é. E isso em relação aos fenômenos da natureza, imagine com o resto!
E o trânsito, então?  Loucura! O desejo é chegar, claro! Dentro do carro dá tempo de ficar se lamentando e reclamando de todas as injustiças do mundo, ou seja, todas as injustiças comigo.
Penso até que se Nachiketas estivesse ali na vinte e três de maio às 17 horas ia achar que inferno é um spa.
Percebo que há um euzinho que é totalmente dominado pelos cavalos dos gostos e aversões. Que se revolta, grita e esperneia com a situação. Quero estar em algum lugar, não onde estou!  Eu quero sentir-me bem! Quero chegar á ________ (e aqui você pode preencher o espaço em branco com o que você preferir) e então, me deleitar de prazer e felicidade. Desejo estar na minha casa, na minha cama ou comendo minha sopinha e estar no carro me frustra. Quando olho para essa situação, algo me diz que não há engarrafamento que dure para sempre. Será o cocheiro?
Seria muito mais sábio exercitar a acomodação (kshanti), liberando-se das expectativas e vivendo o momento. Aproveitar a música, usufruir o confortável banco do carro.
Não há como evitar o inevitável, são milhares de quilômetros de congestionamento. Se eu me perguntar qual a razão para tal sofrimento, vou notar o ridículo da situação.  Lembro-me de mais uma coisa que serve para este momento Ashotya- um probleminha tão pequeno que nem merece muita atenção. E essa sabedoria vem lá de um ensinamento de Krishna, o cara que sabia muito de tudo.
Procurar soluções para se viver melhor é nosso direito e nossa liberdade. Sou a favor de mais bikes pela cidade. Mas quando me noto desejando o mundo perfeito, discursando que devemos abandonar os carros, o cocheiro me dá aquela puxadinha nas rédeas e os cavalos freiam. A única perfeição que existe esta além das coisas que vem e vão, outro ensinamento da Dona Morte.
Numa parte do Katha Upanisad ela oferece para o menino, mulheres, carrões, conta bancária bem gorda, apartamento de frente para o mar, casa de campo com piscina, isenção de impostos, vidão de astro de futebol, em troca, claro, do conhecimento sobre ele mesmo que era o que ele tinha ido buscar. Ela não fala bem assim, mas deu para pegar, não é?
A luta cotidiana é para um dia ser feliz e, para alguns, famoso também, como a pessoa que aparece sorridente na capa da revista numa ilha, num castelo ou no carrão naquele mundo de perfeição! 
Imagina, então, Yamah te oferecendo tudo isso assim, de mão beijada, é difícil de recusar.
A danada está testando o garoto acariciando os cavalos dele, oferecendo uma estrada bem legal para que eles possam trotar felizes. As rédeas começam a se afrouxar com tanta gentileza. O cocheiro tem que ser forte e atento. Momento decisivo.
Se você tem um pouco de maturidade, já deve ter notado que vivemos para conquistar a casa de praia/ campo/_________(preencha com o que quiser) e assim que chegamos lá e estamos olhando o mar, já começamos a pensar qual será próxima conquista.
Logo em seguida queremos outra coisa que está mais lá na frente. Sampa tem um shopping a cada bairro, uma loja super hiper demais em cada pedacinho da cidade, comidinhas e bebidinhas sem fim, bares da moda e muito mais de tudo para seduzir os cavalos. É a tal da estrada dos desejos. Não há um espaço que não venda a urgência de ser feliz.
Não estou aqui falando que o desejo é o mal do mundo e nem para levantar a bandeira do 'vamos acabar com esse demônio', porque ele também te move a agir, à promover grandes mudanças e fazer diferença nesse mundo de coisas mutáveis.
E não há possibilidade de que ele deixe de existir. Só que podemos ser um pouco mais inteligentes e perceber que não tem jeito mesmo das coisas serem como queremos. Que o discernimento tem que conduzir com as rédeas firmes para que a carruagem não saia se quebrando toda por ai, sofrendo, ralando e sentindo-se um bagaço. Rédeas frouxas quem manda são os cavalos. E eles te conduzem para onde bem entender.
A dica para quem sofre com o trânsito é não seja conduzido, conduza sua própria carruagem com sabedoria. Se você fizer isso, pode até pensar em deixar o carro em casa, de vez em quando, e curtir o visual da cidade em cima de uma bicicleta ou andando. Garanto que vale a pena!

JULIANA ARAÚJO - JUJU PRIYAH - Yogini por Amor + instrutora por dedicação + massoterapeuta por vocação + caminhando com samtosha e exercitando compaixão, escreve e edita o blog http://jujupriyahumaniversidade.blogspot.com.br/

20 comentários:

  1. A Juju é demais...uma pessoa do bem!
    Bjsss e linda entrevista!

    ResponderExcluir
  2. A cara dela!Ela é essa mistura toda, mais um pouco!! Amada, amiga, mestra, professora, sempre, gratidão.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Essa mistura toda e mais um pouco? Ai que medo!!!amiga querida,gratidão, gratidão....

      Excluir
  3. Ela é iluminada, né.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. dani, respondi lá embaixo, eu que sei tudo de computador...hahahahahaha

      Excluir
  4. Desculpe Juliana, mas queria saber porque ainda transmitem o Sannya para tanta gente se existe esse pensamento no ar?

    ResponderExcluir
  5. oi anônimo, não faço idéia, mas pensamento no ar não é nada,né? Fica lá um tempo e desaparece. Na entrevista, abri o que eu, indivíduo, penso a respeito desse assunto agora. E deixei claro que posso mudar de idéia, principalmente se alguém me apresentar algo verdadeiro sobre isso. Só posso falar sobre as minhas ações.Há muitas opiniões diferentes e pontos de vista também.Para alguns pode ser que seja muito importante ter um nome com significado, ainda mais, se você não gostar do seu nome de registro (não contive a gargalhada). Há muitos distribuindo sannyas porque foi isso que o mestre espiritual deles ensinou, eu acho. E porque tem pessoas que desejam ter um nome. Simples assim. Espero ter ajudado. Que você esteja em paz! Agradeço sua pergunta!

    ResponderExcluir
  6. oi Daniela Hayashi...vai parecer piegas, mas é isso mesmo...dizem que só vemos no outro nosso reflexo...Amor e gratidão!

    ResponderExcluir
  7. Entrevista excelente, texto inspirador. Gratidão por existir, Juju.

    ResponderExcluir
  8. Ver tuas fotos e ler tuas palavras me trouxe a minha memória a beleza transcendente que emana dos pés de lótus de Krisna.Vc é muito amada por Ele e somos Um em Seu amor infinito.Namastê,André.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Andre, suas palavras sao muito generosas. Sinto realmente que somos todos amados por Ele. Gratidao! _/\_

      Excluir
    2. Vc tá me devendo um japa mala, promessa é divida.Fico muito feliz te ver satiam shivam sundaram,verdadeiramente linda e abençoada.Namastê,André.

      Excluir
    3. Oi Andre..te devendo um japa mala? jura? perai...desde quando??hahahahaha...me ajuda aqui, quem e voce? Andre, o Yogi-medico-pai do Sidharta? Se for voce, sim eu to em divida contigo ha bastante tempo!!! _/\_Om Tat Sat!!!!

      Excluir
    4. A roda da vida girou e nos encontramos novamente.Engraçado que acabei de voltar da India e pensei em vc lá.Ishwara Pranidhana,confie no Universo.Agora que estamos prontos que tal nos revermos? André Pacheco

      Excluir
    5. Com enorme gratidao...encontrou Babaji???vamos la, escreva no meu email seu contato...neelamagaya@gmail.com te entrego o japa mala e conversamos sobre nossas viagens!!!Sera um enorme prazer recebe-lo em casa, grande yogi!!!!um super abraco pra sua familia..

      Excluir
  9. Palavras firmes, esclarecedoras e cheias desse amor maravilhoso!Harih Om!_/\_

    ResponderExcluir
  10. Minha Professora!!!__/\__!!Maravilhosa!!!

    ResponderExcluir