HUMBERTO MENEGHIN
Numa sexta-feira fria e chuvosa, apesar de querer ficar mais um pouco na cama, acordei e no café da manhã comuniquei a tia Auria sobre minha mudança para o apartamento da Claudinha, na semana que vem. A contragosto, essa minha tia, tentando desmotivar, me disse que morar em república só me daria dores de cabeça, mas se eu me arrependesse, me receberia de volta com os braços abertos. Detalhe: para morar com a tia Auria, eu pago oitocentos reais por mês; na Claudinha, talvez eu pague um pouco mais ... Vou me mudar para lá sim! Já está decidido! Quando cheguei ao escritório, enquanto caminhava por um dos corredores, comecei a ouvir passos insistentes atrás de mim, passos que vinham se aproximando, provocando sons audíveis de alguém que pisava firme e forte pelo chão. Então, me virei para saber quem poderia ser:
Era uma mulher muito bem vestida num
conjunto preto, casaquinho/saia, acompanhado por um sapato bonito cujo salto ao
andar produzia sons de uma personalidade marcante que não passava despercebida
em nenhum lugar. Ela esboçou um sorriso para mim e então notei que seus olhos
eram azuis quase saltando das órbitas, acomodados abaixo de uma testa grande
moldada por um cabelo visivelmente alisado de um tom louro.
De repente, ouvi a porta que dava para um
dos banheiros ser aberta e sair uma outra mulher cujo cabelo era bem curto,
trajando uma saia colorida que vinha até os pés e um blazer cor de vinho por
cima de uma camisa branca. Essa mulher também se aproximou, dizendo um breve “olá”.
Ambas já haviam passado dos quarenta e
seus perfumes exalavam aromas muito agradáveis, nada brega, invejei-as! E,
então, a que tinha olhos azuis e testa grande comunicou: “Somos as novas
contratadas, estamos assumindo hoje. Será que madrugamos?”
Respondi que não, que já estávamos quase
na hora de começar, mas que a maioria ainda não havia chegado. E a de cabelo
curto devolveu: “Se fosse na Alemanha já estavam pegando duro.”
Elas se apresentaram. A loura cuja testa
era grande se chamava Kátia Cristina e a mais baixa com o cabelo curto de um
ruivo mais escuro falou que se chamava Ana Luiza. Perguntaram por Walkiria, Dr.
Oriovaldo e Paulo Roberto dizendo que em meia hora todos estariam em reunião. Seguimos
para sala principal e elas se acomodaram num conjunto de sofá próximo às
janelas, enquanto degustavam um expresso feito na máquina.
Marinice apareceu esbaforida pelo
ambiente perguntando-me em voz baixa quem eram aquelas duas mulheres. Após informa-la,
muito surpresa, ela me disse de volta: “Mas, como eu não sabia disso?!”
Em pouco tempo Walkiria, Miriam Mitiko e
Paulo Roberto apareceram e se uniram à Kátia Cristina e Ana Luiza. Rasgaram as
sedas uns dos outros e riram de não se sabe bem o que para depois Walkiria
anunciar: “A Kátia Cristina será a nossa nova Diretora Setorial e a Ana Luiza a
Gestora de Negócios. São muito bem vindas nesta nova fase empreendedora que
vivemos. Mais detalhes, depois”.
Enquanto todos iam para a sala de
reuniões conversando e rindo, Marinice veio até mim novamente dizendo que não
tinha ido com a cara de nenhuma delas. Pois bem, não liguei para isso, mas
durante toda a manhã o grupo continuava em reunião para somente ao meio dia e
vinte e cinco aparecerem pela sala principal, aparentando estarem mais felizes
do que antes. Então, soube que iria trabalhar diretamente com a Kátia Cristina,
a mulher com a testa grande e olhos azuis e que a Claudinha iria trabalhar com
a outra, a Ana Luiza.
Kátia Cristina veio até mim e me
perguntou: “Você medita?” Respondi que praticava e Yoga e que estava
engatinhando na meditação. Ela soltou uma risada ampla dizendo: “Vamos nos dar
muito bem, querida! Trabalho no padrão Google,
lá eles adotam esse tipo de coisa, a meditação, fiz cursos a respeito: Mindfulness!” Você sabe o que é Mindfulness?” – disse se afastando, sem
concluir, dando as costas para mim indo junto com todos os outros para
almoçarem.
Na parte da tarde quando retornei do
almoço soube que as novas contratadas assumiriam na segunda-feira. Comuniquei
Júlia, minha estagiária, sobre elas sugerindo que mudasse o estilo de se vestir
para vir trabalhar. Rindo, Júlia deu de ombros não dizendo nada.
Logo que a noite chegou, fui conhecer o
apartamento da Claudinha, ali na General Osório, quase perto do Centro de Convivência,
mais precisamente no edifício Athenas, décimo primeiro andar, unidade 111.
Notei que a porta já estava semi -aberta, pois o porteiro tinha me anunciado
pelo interfone.
Ao me aproximar percebi uma movimentação
inesperada: um sujeito baixo, moreno claro com um cachecol enrolado no pescoço,
trajando uma camiseta onde estava escrito A.
& Fitch – New York, surgiu segurando
numa das mãos uma xícara grande da cor laranja, feita de cerâmica. Concluí que
ele seria o Júnior, o primo da Claudinha e acertei.
Júnior pareceu diminuir os olhos ao me
ver e ainda segurando na maçaneta da porta me disse para que entrasse e que
ficasse a vontade, enquanto a Claudinha terminava o banho. Gentilmente ele me
ofereceu um caldo quente que até então degustava naquela xícara grande, dizendo
que eu adoraria.
Simpatizando-me com o Júnior, resolvi
aceitar o caldo quente. Em pouco tempo, ele me trouxe uma xícara grande do
mesmo tamanho da dele, só que verde musgo, contendo o tal caldo. Experimentei e
até que gostei.
E, sentando-se numa poltrona estilosa na minha frente, cruzando
as pernas, Júnior me disse: “Fui com a sua cara, você vai amar morar aqui com a
gente. A Keilane chega daqui a pouco, me mandou uma mensagem. Uma graça a
KeiKei, linda, minha amiga!!! Olha lá! – dizia apontando para uma das paredes
em direção a um pôster grande na parede que estampava a face de uma mulher
bonita – A Keikei! Foi eu quem a produziu, foi eu quem a fotografei. Tá um
Luxo! Não tá?”
A porta do apartamento começou a se abrir
e a Keilane chegou.
Harih
Om!
Nenhum comentário:
Postar um comentário