HUMBERTO MENEGHIN
Após um OM sonoro que parecia não acabar
mais, Lili exibiu seu melhor sorriso dizendo: “Lindeza ouvir um OM sincero vindo
do fundo do coração, essa vibração secular faz mágica, sabia? Um mestre
Hinduísta dos Himalaias costumava entoar dentro da caverna que vivia e
curiosamente após anos uma rocha dentro dessa mesma caverna moldou o OM. Mágico
isso, né? Essa caverna, esse OM, vamos meditar lá dentro, vocês comigo, reviveremos
a sintonia desse mestre amadinho, privilégio exclusivo de quem for comigo pra
Índia na viagem que eu estou organizando. Falem com a Tati da Cambuí Travel Trips Viagens. Reservem
seus lugares. Amooo! ...” parou por um momento notando Neuzinha entrar atrasada.
Repreendendo-a, Lili soltou: “Mas isso são horas, minha linda! Não tolero
atrasos aqui na minha sangha, viu?
Será que eu vou ter que puxar a sua orelha para que isso não aconteça mais?”
Sem jeito, Neuzinha devolveu: “Desculpa, professora. Tive um imprevisto.”
Levantando-se, Lili aproximou-se de Neuzinha e lhe deu um abraço: “Tá perdoada,
meu anjo. Vai lá, estenda seu tapetinho pra gente continuar a aula. Mas, depois,
conversaremos no final, entendeu?”
Neuzinha retardatária pegou o espaço ao
meu lado e Lili nos levou a fazer vinyasas
misturados a Suryas que logo já
começaram a me cansar. Andando de um lado para o outro da sala com um smartphone em punho, aquela professora
de Yoga ia tirando várias fotos de quem estava lá praticando para dizer:
“Mandei, mandei ... agora vocês estão no meu Instagram, #YogaLiliBombando e no Face! Curtam. Curtam horrores!”
A prática prosseguiu até que fluída, mas
eu não estava me sentindo bem com o jeito como Lili conduzia a aula, pois,
muitas vezes quando ela pegava alguém fazendo alguma postura de forma incorreta,
repreendia bruscamente, corrigindo, para em seguida falar uma palavra
“carinhosa” tipo: “Assim que a tia gosta, meu amor”. “Agora sim, linda!” “Vai
pra Índia comigo, confirmado! Amei, viu? Verinha, fala comigo depois; tá
arrasando hoje, Santa !”
Posturas para cá e para lá, eu tentava
imaginar como estaria sendo a prática com aquele novo professor, Nando, na sala
ao lado, onde os dissidentes desta estavam praticando. Será que ele estava
sendo melhor que a Lili? Vou perguntar depois para o Paulo Roberto. Então, ouvi
a professora dizer: “Momento shavásna,
meus amores! Deitem-se, aconcheguem-se. Se dormirem, não ronquem, entenderam?”
E Lili colocou uma das músicas da Enya;
mas, o som estava tão alto que buscar qualquer tipo de relaxamento daquele jeito
não estava dando. Então, ouvi alguém dizer para que ela diminuísse o volume;
mas, ao invés disso, Lili simplesmente eliminou a trilha sonora e começou a
falar num tom médio de voz: “Soltem-se, percebam o Ser latente, soltem-se.
Aquele Ser que busca a paz, que se regozija com a beleza que a cada um
pertence.”
Minutos passavam arrastando-se e de
repente a ouvi dizer: “Agora acordem, o shavásana
está bom, mas levantem-se, meu povo, levantem-se que nós vamos meditar.
Vamos, vamos lá, a pamonha não é de Piracicaba como estão dizendo aí fora no
caminhão que passa. Ninguém quer comer essa droga de pamonha agora! – berrava Lili janela a fora.
–“Silêncio, gente! Saiam daqui que vocês estão perturbando a minha sangha!”
Acomodamos para meditar, mas ainda podíamos
ouvir a gravação contínua da voz de uma mulher num autofalante de um veículo
que passava na rua em frente, anunciando a venda das pamonhas de Piracicaba, fresquinhas,
quentinhas, feitas do puro creme de milho verde... as pamonhas de Piracicaba,
Piracicabaaaa!!!
Harih
Om!
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