Dando
continuidade ao livro The problem is you, The solution is you,
nesta segunda parte, Swami Dayananda nos fala sobre a procura incessante
daquilo que pode estar bem à nossa frente mas, devido à ignorância, não
percebemos. Para uma proveitosa compreensão do texto, sugerimos a leitura da
primeira parte: “O
problema”. No entanto, a sabedoria aqui presente independe de
qualquer outro complemento.
PARTE 2 – A
BUSCA
OS DOIS
TIPOS DE BUSCA
Qualquer
coisa que seja considerada desejável por nós se torna um objeto de busca. Há
dois tipos de busca em nossa vida. A primeira é a busca pelas coisas
que considero desejáveis e que ainda não tenho. Coisas como conforto,
dinheiro, poder e descendência estão nesta categoria.
Eu vou
em busca dessas coisas e me empenho no esforço necessário para obtê-las e
conquistá-las, utilizando o conhecimento, as habilidades e os recursos que
tenho disponíveis. Essas coisas que busco são muito desejáveis para mim em um
dado momento e então isto se torna sadhya, ou seja, aquilo que deve
ser conquistado. Entretanto, mais tarde, eu posso mudar o meu ponto de vista
sobre isso.
O
segundo tipo de busca também está vincuada aos objetos que consideramos
desejáveis, mas com uma diferença. Enquanto que o primeiro tipo de
busca pertence aos objetos que não tenho, este segundo tipo de busca se
relaciona aos objetos que tenho, mas acho que não tenho.
Aqui, o
tipo de busca também é a mesma da que acontece no primeiro caso.Eu acho que
não tenho uma coisa e então eu começo a procurá-la por toda parte. É como o
caso da pessoa que busca seus óculos perdidos.
Esse
homem, em um domingo pela manhã, queria ler o jornal e para isso precisava de
seus óculos. Abriu a gaveta da escrivaninha, pegou os óculos, colocou-os e
começou a ler o jornal. Enquanto ele estava lendo, um amigo apareceu para
vê-lo. Então, deixou o jornal de lado, ergueu os óculos para acima da testa e
começou a falar com o amigo. O amigo se foi e depois de meia hora este homem
quis voltar a ler ao jornal e ao pegá-lo notou que precisava novamente de seus
óculos para leitura e então, começou a procurá-lo. “Onde estão meus óculos?” Ele os procurou em todos os lugares possíveis.
Os
óculos não estavam sobre a mesa, não estavam na gaveta, nem pelo chão. Quando
percebeu que não podia encontrá-los em lugar algum, começou a gritar: “Onde
estão meus óculos?” A esposa veio da cozinha e começou a olhar para ele e as
crianças também vieram assistir aquela cena. Finalmente, o filho mais novo não
conseguiu mais se segurar e apontou para os óculos, que estavam na testa do
pai. Aí, o homem percebeu que os óculos que estava procurando estavam com ele o
tempo todo.
Então,
o que buscava estava lá não por que aquele homem não tinha os óculos, mas sim
por que ele pensou que não os tinha. Ele era o problema e ele foi a
solução. Ele era o problema porque ele achava que não era o possuidor dos
óculos. Ele foi a solução porque ele era o possuidor dos óculos.
Não há
distância física alguma entre aquele que não possui e o possuidor dos óculos.
Mas ainda há uma distância a qual o faz um buscador. Esta distância é criada
pela ignorância. Portanto, alguém pode buscar por aquilo que não tem e como
também pode buscar por aquilo que acha que não tem. Então, se alguém acha que
não tem aquilo que deseja, a única coisa a se fazer é buscá-la.
A BUSCA
NA VIDA DOS HUMANOS
Se nós
olharmos para a nossa vida e nos perguntarmos o que nós tanto buscamos, nós
encontraremos todos os tipos de coisas, coisas as quais estamos mais do que
prontos para tê-las ou do contrário, coisas das quais queremos nos ver livres.
Toda essa urgência que o ser humano sente em buscar o que deseja, se incluem
nestas três categorias básicas:
1)
viver uma vida longa,
2)
obter felicidade, e
3)
adquirir conhecimento.
Você se
dedica a uma série de atividades para se manter vivendo: “eu não quero morrer
hoje; quem sabe amanhã.” Isto significa que não há o amanhã, pois todo amanhã é
hoje. Eu estou vivo no presente momento e eu não posso pensar na destruição da
minha existência. Há um amor natural inerente ao Ser.“ Eu quero viver” é um
anseio natural, não é planejado por ninguém. Até um recém nascido tem o anseio
por viver, pois há uma grande força nele mesmo que o sustenta como um ser
vivo.
Há,
definitivamente, uma força que evita a morte e também a velhice. Mas, nós
também encontramos pessoas que se sentem como se estivessem cometendo suicídio.
Então, parece que aquele propósito, aquela força para viver não é um desejo, um
anseio universal, por que há contradição, pois alguém está pronto para desistir
de viver.
Então
eu adiciono mais um ponto: eu quero viver e viver feliz. E, se eu levar em
conta toda a minha vida, vou chegar à conclusão que o futuro não me traz
nenhuma garantia de felicidade e a tristeza predomina em mim, e assim, me torno
deprimido. Este processo errado de pensar pode me levar a cometer suicídio.
Então, alguém comete suicídio para escapar da tristeza; destarte, o anseio de
viver feliz é tão poderoso quanto o anseio de simplesmente viver.
Então,
como ser humano, este não pode permanecer ignorante. Desde a mais tenra idade
há um chamado ao conhecimento. Você dá um brinquedo para uma criança
brincar e a primeira coisa que faz é abri-lo. Perguntas como: Por que? O que?
Como? Vem a mente daqueles que estão prontos.
Há
pessoas que gostam de saber das fofocas, de ler jornais, revistas, etc., porque
nada deveria acontecer sem que fiquem sabendo. Então, a ignorância é algo que
você não pode suportar. Você está com uma grande pressa, correndo com seu carro
e encontra um grupo de pessoas reunidas pela calçada e então você diminui a
velocidade, coloca a sua cabeça para fora do carro e tenta descobrir o que está
acontecendo.
Se você
quiser atrapalhar o sono de sua esposa durante a noite, apenas diga a ela antes
de ir dormir que tem uma coisa muito importante a lhe dizer, que você não pode
contar naquele momento e que ela tem que aguardar até a manhã seguinte. Ela
implorará a você que pelo menos conte um pouco sobre o assunto, pois ela não
conseguirá permanecer na ignorância de não saber do que se trata.
É assim
que as revistas, novelas e séries de televisão mantêm a curiosidade viva
cortando a estória ou drama quando chegou a um ponto crítico e então você vai
querer ler a próxima edição ou ver o próximo capítulo. Nós fazemos o mesmo em
nossas conversas, pois a ignorância atrapalha apenas quando incomoda e se você
sabe pouco, você vai querer saber mais. Então, todas as atividades na vida são
para preencher esses três naturais anseios.
Há
ações para postergar a morte e retardar o envelhecimento porque eu concluo que
eu sou mortal. Há ações que me fazem mais feliz do que sou. Eu quero me livrar
da infelicidade, pois cheguei a conclusão de que sou infeliz. Eu me sinto
incompleto e então existe um desejo de me ver livre de não ser completo, da
infelicidade. Essas ações fazem com que eu me torne mais informado, adquira
mais conhecimento, porque eu cheguei a conclusão de que sou ignorante.
Essas três conclusões: eu sou mortal, eu sou infeliz ou incompleto e eu sou
ignorante – formam a base de todas a minhas ações. Estas três conclusões são o
problema e o Vedanta diz que esses são problemas indesejáveis. Na visão do
Vedanta, você é apenas o oposto do que você quer se tornar.
Eu sou
infeliz é o problema que é resolvido apenas quando eu vejo e percebo que o “eu”
é uma outra coisa, algo que é distinto do ser triste – não é a tristeza e que
está livre da tristeza. O Vedanta diz que o “eu” é livre da tristeza e é o
que nós veremos agora.
O
PROBLEMA DA TRISTEZA ESTÁ CENTRADA NO “EU”
A
tristeza surge independente da noção de “eu sou triste”, e o problema da
tristeza somente pode ser resolvido quando me conscientizo do fato que “eu não
sou triste”. Na visão do Vedanta eu sou apenas o oposto do que quero me tornar
e de onde quero me ver e estar. Se você chegar a conclusão de que é limitado –
que tem limitações, você tem que ser libertar disso. Se há limitação no “eu”,
também deveria haver liberdade, liberdade da fome, sede, de ser discriminado
pelo mundo. Esta liberdade tem que estar centrada no “eu”, não pode estar fora
de você, muito menos dentro de você. Tem que ser você.
Se a
tristeza é decorrente do mundo em que vivemos, a felicidade também é. Você se
vê triste quando apenas vê um lado da situação; saiba que há o outro lado
também, o qual é tão bom quanto o esse lado e que pode fazer você feliz. E, é
isso que nós chamamos samsara.
Sukhi
aham (eu
sou feliz); duhkhi aham (eu sou infeliz). Agora, pode-se
entender que sukham (felicidade) é uma coisa e sukhi (feliz)
é outra.Duhkham (infelicidade, dor, mágoa) é uma coisa e duhkhi (infeliz,
estar magoado) é outra coisa.
Há uma
coisa importante a saber: Duhkham é mágoa enquanto que duhkhisignifica,
eu estou magoado, eu estou triste. Agora todo o nosso esforço é para
remover duhkham, para remover a mágoa trazida por mudanças nas
situações da vida. Mas o problema não é duhkham, mágoa; o problema
é a idéia, “aham duhki”– eu estou magoado.
O
animal tem apenas sukham e duhkham, prazer e dor.
Eles não tem o conceito, a percepção, aham sukhi – eu sou
feliz ou aham duhkhi- eu sou infeliz.
Uma
vaca pode ser uma vaca sortuda se tiver alguém que a alimente bem e cuide dela.
É uma vaca saudável e sente o prazer, mas não tem a noção, o conceito do que
é sukhitvam, a noção do “eu sou feliz”. Ela também não tem um
complexo “eu sou uma vaca superior, eu pertenço a tal família” etc... A
vaca não tem qualquer senso, noção ou julgamento como este, centrado no eu,
nela mesma. Se outra vaca tem os cifres tortos ou feios, ela não pensa “Eu sou
feia, outras vacas são mais bonitas do que eu. Eu não sei o que fazer,estou
presa a estes chifres que não posso removê-los e ainda eles me chamarão de uma
vaca defeituosa”
Vacas
não têm um problema como este. Se uma vaca não obtém comida, ela sente dor e se
obtém comida, definitivamente há algum prazer nisso. Vacas sofrem e
experimentam conforto, mas elas não parecem ter qualquer noção de duhkhitvam ou sukhitvam,
de ser triste ou estar alegre.
O ser
humano, por sua vez, tem o julgamento centrado no “eu” e isto faz com seus
problemas aumentem.
O homem
branco quer ser branco, mas não tão branco. Isto é um complexo e então ele vai
a praia se bronzear, suportando o calor para se tornar um pouco menos branco. O
negro tem os seus próprios complexos: ele quer ser um pouco mais branco. Na
Índia, nos temos nossos próprios complexos. “a garota é bonita, mas é escura!”
Vacas não tem tais complexos.
Há duas vacas as quais pertencem à mesma criação,
tem a mesma idade e fornecem a mesma quantidade de leite. Mas, há uma grande
diferença no preço de venda delas. Por quê? Porque uma vaca tem os chifres bem
formados e a outra os tem tortos! As vacas em si não tem consciência desta
diferença e então elas não tem nenhum complexo. É o proprietário das vacas que
tem problemas! Esse problema de complexos gerado por ele é um problema humano.
O ser
humano é consciente dele mesmo ou dela mesma e como pessoa, se vêsukhitvam (o
estado de ser-estar feliz) e duhkhitvam (o estado de ser
infeliz). Então surgem estes tais complexos como “Eu sou sukhi (feliz)”,
“eu sou duhkhi (infeliz)”. “Eu sou limitado”, “estou sendo
passado para trás pelos outros”, etc.. Esses são problemas e ser dependente de
cem milhões de coisas para me sentir seguro e feliz é um problema.
O mundo
é infinitamente vasto e independe de mim, mas tem a capacidade de me limitar.
Eu nasci com essa dependência do mundo, limitado por isso, condicionado por
isso. Eu sempre me manterei limitado e condicionado pelo mundo. O mundo
definitivamente me limita e aqui está o problema, se isso me torna duhkhi,
o problema de duhkhitvam nunca poderá ser resolvido. Sedhukhivam aparece,
surge do mundo, se a minha infelicidade acontece porque o mundo me limita, eu
sempre deveria estar duhkhi triste, limitado, magoado. Mas
apesar de minha pequenez, ser limitado pelo mundo, ser desprovido de muitas
coisas que eu quero, que desejo ter, eu me vejo ocasionalmente uma pessoa
feliz.
Durante
este momentos a verdadeira pessoa que se olha como triste, agora se
vê como feliz. O que mudou no mundo ou no “eu” para me tornar feliz? O corpo
não mudou, as emoções, o conhecimento, as lembranças não mudaram. Eles
continuam os mesmos. O mundo não mudou, o emprego não mudou, o governo não
mudou; eu ainda tenho as minhas queixas contra a comunidade. Então o mundo
ainda me limita muito e eu sou capaz de rir. Tornar-me feliz agora e isso
significa que esses são os momentos que eu me vejo diferente, completamente
diferente. Formalmente eu me vejo como duhkhi e agora eu me
vejo como aquele que é livre de duhkham, e isto acontece mesmo
quando eu acho graça e rio de uma simples piada.
Havia
um homem que achava que era um gato. Ele estava com medo de sair de casa,
porque nas ruas havia cachorros e ele achava que eles iriam pegá-lo. Esse homem
foi levado ao psicanalista que o convenceu, através da comparação com um
verdadeiro gato de que ele não era um gato, que não se assemelhava nenhum pouco
a um gato. E por comparação, o psiquiatra convenceu aquele homem que ele
possuía todas as características de um ser humano. Uma vez convencido pelo
psicanalista, sentindo-se aliviado do complexo, o homem se tornou feliz. Mas no
dia seguinte, continuou a evitar a sair na rua! Ele retornou ao psiquiatra, que
perguntou: “Você ainda não está convencido que é um ser humano e não um gato?”
“Sim, eu estou convencido.” “ Então, por que você está com medo de sair de
casa?” “ Eu sei que não sou um gato, mas como os cachorros sabem que não sou?”
Você
pode rir disso agora. O que mudou em você? Que problema você solucionou?
Seu trabalho é o mesmo; sua esposa está doente; a sogra ainda não foi embora!
Todos os problemas estão intactos e você continua rindo. É verdade que
existem problemas os quais tem que ser enfrentados, objetivamente. Mas o
problema da tristeza não tem nada a ver com o mundo exterior. O problema da
tristeza está centrado em você, na visão e noção que você tem sobre você mesmo
e o mundo.
Você é
o problema quando diz: “Eu estou triste”. E quando você ri, o que você é? Como
você se sente? Você é a solução. Não existe nenhum desejo preenchido ou
nenhuma solução para o problema externo quando você ri. Tudo o que aconteceu é
que você se olhou como você é. Tudo o que foi necessário para você se ver livre
da tristeza é que você se viu como você é.
Está
escrito em nossas escrituras que a mente é a causa para o nosso
aprisionamento e libertação. A mente aqui significa a noção, a idéia que
você tem de si mesmo – sua conclusão: “eu estou muito só”. Esta noção que você tem,
este auto julgamento é um problema e portanto a clareza mental, o auto
conhecimento é a solução.
Na
visão das Upanisads, o eu é livre. Como no exemplo do quebra cabeças, quando
você acha que a solução para o quebra cabeças está fora do problema, o apta,
aquele que conhece, tem sabedoria, pode ver a solução no próprio problema.
Na
visão dos sastras, das escritura, a previsão de que eu sou a
solução é válida o suficiente levando-se em conta que apesar de todos os
problemas, eu me vejo e me sinto ocasionalmente feliz. Se todos estes
problemas, estas noções são reais, não posso deixá-los de lado. E eu jamais
posso ser feliz, a não ser que eu deixe de lado esses problemas e essas noções
que me limitam.O fato
de eu me sentir feliz significa que é possível deixar de lado estas limitações
que tenho de mim mesmo.
Agora
considere um menino que acha que seus dentes não são bonitos, nem bem feitos.
Seus dentes não são alinhados, ele tem dois dentes extras. Ele não aceita esses
dentes e ele está consciente que seus dentes são feios. Ele deliberadamente
evita sorrir e fecha a boca logo que se lembra de seus dentes. Mas mesmo assim,
algumas vezes este menino sorri. Você sabe por quê? Porque naquele momento, ele
é uma pessoa que realmente é; ele deixou de lado a idéia de que é feio. Aquela
noção, aquela idéia não real; algumas vezes ele se pega rindo e então
está claro que o garoto não é feio realmente e que ele está se vendo de uma
maneira errada. A visão do sastraé válida.
Minha
aspiração natural para me ver livre da infelicidade é uma prova válida de que o
“eu” é livre e feliz. Há uma aspiração natural para se ver livre de ser
infeliz. Eu gosto do que é natural e eu quero me ver livre do que não é
natural. Se a infelicidade e a mediocridade fossem naturais para mim, se fossem
características essenciais de Atma, do Ser, eu nunca poderia me
livrar delas. Mas durante o sono profundo e nos momentos de felicidade, eu
realmente me desvinculo de todas as idéias–noções que me fazem sentir pequeno,
limitado. Eu me vejo feliz quando estas limitações não estão presentes.
(continua)
Harih Om!
A primeira parte de O PROBLEMA É VOCÊ, A SOLUÇÃO É VOCÊ está em:
Nenhum comentário:
Postar um comentário