5 de outubro de 2012

YOGA EM VOGA ENTREVISTA – LUCIANA GUERIN




HUMBERTO MENEGHIN


YV – Foi em 1990 que você teve o primeiro contato com o Yoga, quando começou a praticar em Campinas/SP, no momento em que cursava Comunicação Social na Puccamp. Com certeza você não poderia sequer imaginar, naquela época, que a sua vida profissional tomaria outro rumo, que o jornalismo seria deixado de lado para você se dedicar integralmente ao Yoga. Essa decisão foi difícil de ser tomada? Ou o Jornalismo parou de correr nas suas veias? Não daria para conciliar as duas vocações?

LU – Isso mesmo, Humberto. Estava na penúltimo ano da faculdade quando fiz minha primeira aula de Yoga da vida. E adorei! A sensação foi a de se sentir em casa. Na época, estava bem entusiasmada com a carreira de jornalismo que teria pela frente. E assim se passaram 15 anos até o trabalho de jornalista ser trocado pelo de professora de Yoga. Não foi uma decisão difícil. Costumo maturar minhas decisões, e quando comecei a dar aulas já estava bastante envolvida com o Yoga como um caminho de vida. A minha intenção nunca foi a de conciliar as duas profissões. Eventualmente, faço algum trabalho jornalístico, que não interfira na minha rotina de aulas. O jornalismo não deixou de correr nas veias. Eu adorava o que fazia, predominantemente, a reportagem televisiva. Mas a rotina de trabalho era bastante estressante, cansativa e, especialmente, não me permitia manejar o meu tempo como eu quisesse. E isso não estava legal. Não era mais a forma como eu queria viver. Na época, as circunstâncias me facilitaram essa transição.




YV – A Luciana Guerin que apresentava um programa da tarde na extinta TV Thati de Campinas e que posteriormente trabalhou como repórter na TV Cultura em São Paulo e ainda no programa Alternativa Saúde da GNT, acha que nos meios de comunicação, em especial na TV, há espaço suficiente para se divulgar temas que tratam sobre o Yoga e o Autoconhecimento ou esses assuntos estão bem longe do interesse da mídia e da grande massa? E, se houvesse um pouco mais de interesse, qual seria a forma adequada para essa divulgação?

LU – Poderia haver mais espaço nos meios de comunicação. No caso da televisão, onde sempre trabalhei, tudo é rápido e, com exceções, superficial. O que é notícia agora daqui a cinco minutos vira notícia velha. O repórter, muitas vezes, tem um tempo pré-determinado para discorrer sobre o tema. Assim como tem pouco tempo pra se preparar, se aprofundar no assunto. O que complica ainda mais as coisas. Não raro vejo a somatória entrevistadores + entrevistados despreparados resultar num desperdício do tempo e do espaço que dispõe, quando o tema em pauta é o autoconhecimento. E sabemos que o autoconhecimento é um processo, não acontece ao se escutar meia dúzia de frases feitas. Quanto ao Yoga, em particular, o aspecto físico da prática, os ásanas como “ginástica exótica”, infelizmente, prevalece. E tudo o mais que o Yoga propõe, em termos de visão e valores de vida, são ignorados. Qual seria a forma mais adequada de divulgar esses temas? Talvez tentando entender mais a fundo o assunto e escolhendo as fontes-entrevistados de forma criteriosa.




YV – Nos Estados Unidos a mídia ligada à propagação de produtos para a prática do Yoga é bem marcante. Compra-se e vende-se de tudo o que se possa imaginar e por lá parece que o número de praticantes de ásanas do Yoga e simpatizantes aumenta cada vez mais. Por um lado isso pode ser até válido. No entanto, você acha que o número de pessoas que realmente se interessam pelo Yoga para buscar Autoconhecimento ainda é bem pouco, tanto lá como por aqui? E, ainda, você acha que meditar e se dedicar ao estudo do Vedanta é fundamental para o professor e o praticante que se interessa pelo Yoga que vai além dos ásanas?

LU – Sei de cenário de consumo relacionado ao Yoga nos EUA, mas como você mesmo disse, isso parece contribuir – obviamente, além de mais grana no bolso dos fabricantes de tais produtos- somente para gerar apenas mais praticantes de ásanas”. E isso não significa praticar Yoga. É claro que devem existir muitas pessoas interessadas no autoconhecimento, mas a maioria, talvez não esteja. Trazendo para nossa realidade, no meu entorno, nas minhas experiências, lamentavelmente vejo que a busca pelo autoconhecimento ainda é uma escolha de poucos. Parece ser algo que as pessoas nem saibam que seja possível, que isso exista. E continuam insistindo em encontrar paz, plenitude e felicidade em situações e objetos que nunca poderão proporcionar isso, a não ser de forma momentânea e ilusória. Quando apresentadas ao caminho do autoconhecimento, consideram algo complexo, abstrato, de difícil entendimento. Desistem antes mesmo de começar. Uma pena.




No meu caminho, o Yoga veio primeiro que o Vedanta. Acho que pra muita gente é assim. Hoje, os dois tem igual importância nos meus estudos. E sou grata por ter tido acesso a esse conhecimento, a essa forma de transmissão de conhecimento da realidade, sobre a minha verdadeira natureza, o mundo e a criação. Invariavelmente, quando leio ou escuto esse ensinamento, é como se ele caísse como uma luva para o momento que estou vivendo. É sempre uma luz que ilumina o cenário geral. Ver que há uma ordem em tudo. Compreender que tudo está bem do jeito que é. Que tudo é exatamente do jeito que tem que ser. Que tudo é para o meu bem, ainda que na hora dos perrengues eu não consiga enxergar isso. Enfim, respondendo a sua pergunta, sem dúvida acho que o professor e o praticante de Yoga só tem a ganhar ao se dedicar a prática da meditação e ao estudo do Vedanta.

YV – Quais são as fontes do seu Autoconhecimento? Dentre as escrituras que você leu, estudou e refletiu, qual ou quais delas você mais aprecia? Alguma em especial a tocou profundamente a ponto de ter contribuído de uma forma positiva para que um condicionamento que a limitava fosse diluído? 

LU –Todas as escrituras as quais tive acesso, de um maneira ou outra, sempre foram enriquecedoras de conhecimento. Assim como todas as práticas de Yoga que fiz até hoje sempre foram boas. Aprendizado, sempre. A possibilidade de ver a si mesmo, em termos de corpo, mente e emoções de uma forma mais clara, objetiva e compassiva. O mesmo vale para a relação com os outros e as circunstâncias de vida. Atualmente, estou estudando a Bhagavad Gita através das aulas gravadas da professora Gloria Arieira, por quem tenho profundo respeito e admiração. Esse estudo, assim como outros que já fiz de textos de Vedanta, sempre me colocam no prumo, pra falar de uma forma bem direta. Fazem com que eu enxergue a minha existência com uma maior amplitude de visão, assim como a lidar com as dificuldades com mais temperança e objetividade. Já fiz um estudo mais breve da Bhagavad Gita, cerca de 2 anos atrás. Este ano iniciei um estudo mais extenso. São 140 cds com cerca de uma hora de gravação cada. Estou na metade do estudo.





YV – Além de ter participado de várias Formações em Yoga, dentre elas com os professores Pedro Kupfer, Kalidas Nuyken e Regina Ehlers, em 2009, você morou em Buenos Aires, onde também praticou sob a supervisão da professora-sênior de Iyengar Yoga, Marina Chaselon. Como essas formações e práticas contribuíram para você se tornar a professora de Yoga que é hoje?

LU – O contato com o Pedro Kupfer, desde sempre, me instigou a aprofundar o meu conhecimento sobre o Yoga. O que me levou, através dos ensinamentos dele, a ter bem clara a visão de que o Yoga vai muito além os ásanas, valorizando assim aspectos menos populares, porém não mesmo importantes do Yoga. Como por exemplo, os yamas e nyamas, que são o alicerce do Yoga, e consistem em 10 recomendações do que deve ser feito e o que deve ser evitado a fim de organizar a nossa prática, o caminho do autoconhecimento, as relações, enfim a vida. Com a Regina Ehlers, eu conheci o Ashtanga Vinyasa Yoga, tendo a sorte de praticar com uma professora sensível e responsável na hora de fazer os ajustes no aluno, um aspecto marcante dessa prática. Com o Kálidas Nuyken eu aprendi muito sobre ásanas, através do Iyengar Yoga. Detalhes sobre montar e se aprofundar na postura. Uma sintonia fina da biomecânica do ásana. Conhecimento que me é extremamente útil para dar aulas, lidar com os diferentes corpos e condições físicas. Já a Maria Chaselon me trouxe a experiência de fazer uma prática de Iyengar mais solta, menos rígida, usando na medida certa, desde o meu ponto de vista, a quantidade de orientações que o professor dá a o aluno em busca do alinhamento.







YV – Há cerca de um ano você abriu o próprio espaço de Yoga, na Vila Madalena, em São Paulo/SP, o Sitaram Yoga. O que a levou a escolher esse nome e qual é a missão do Sitaram Yoga? Por enquanto, somente você é quem ministra aulas no espaço ou há outros professores? E, o que você diz para o aluno ou a aluna que vai praticar Yoga pela primeira vez no Sitaram? As aulas oferecidas são somente de Iyengar Yoga

LU – Os mantras para o casal Sita e Rama sempre me emocionaram muito. Tanto pelo paradigma dos amantes que superam as dificuldades, como por representarem o caminho alinhado com o Dharma, e ainda com relação ao aspecto da união entre o ser individual (jiva) e a sua essência (atma). Isso tudo me levou a escolher o nome Sitaram para o meu Espaço.




Não existe uma missão, mas o intuito de compartilhar com os alunos as minhas experiências com o Yoga, de forma acolhedora e compassiva. Por enquanto, somente eu ministro as aulas, que se baseiam nos princípios do Iyengar Yoga. Acho que utilização de props- como os cintos, blocos e cobertores- torna a prática mais confortável e, principalmente, democrática, permitindo que cada um execute os ásanas de acordo com as suas possibilidades. O que digo para o aluno que vem pela primeira é que faça a prática com atenção, evitando comparações com a pessoa ao lado. E que mais importante do que os ásanas que ela faz é o estado no qual ela entra ao fazer as posturas, de uma maior atentividade e consciência.




YV – Cada praticante tem um corpo diferente. Uns são mais flexíveis, outros menos, outros ainda tem dores nas costas, nos joelhos e até mesmo alguma limitação no movimento, na saúde. Como a prática do Iyengar Yoga pode auxiliar os praticantes a desenvolverem uma consciência corporal que os permita se sentirem renovados e quem sabe livres de suas limitações físicas?

LU - Na minha experiência com Iyengar Yoga, vejo que ao detalhar o caminho para o praticante entrar, permanecer e sair da postura, isso faz com que ele descubra, se dê conta de partes do corpo até então desconhecidas. E a consciência do corpo é uma porta de entrada que pode te levar a consciência do seu Ser mais profundo, da sua essência. Usamos a trajetória que vai do denso para o sutil. Reforço a minha opinião de que a utilização dos props permite que a pessoa faça a sua prática com conforto, segurança e dentro das suas possibilidades, respeitando a sua condição física.  Além disso, a consciência que você direciona para o corpo durante a prática, focando a atenção aos detalhes dos movimentos e das ações para executar o ásana, isso faz com que você crie presença no agora, te traz para o tempo presente, evitando que sua mente passeie tanto no passado quanto no futuro. Isso serve como um treino para manter a consciência naquilo que você está fazendo. O que, idealmente, deveria acontecer em todos os momentos da nossa vida.


YV – Se você se encontrasse com o Iyengar o que você diria a ele?

LU – Primeiramente, o saudaria e o agradeceria por sua dedicação em investigar, experimentar e criar meios para tornar os ásanas possíveis de serem executados por qualquer um. Aproveitaria também para perguntar a sua opinião sobre a forma como o Iyengar Yoga vem sendo disseminado pelo mundo. Se não estaria havendo um foco demasiado nos ásanas, não sobrando espaço para aspectos mais sutis do Hatha Yoga como os pranayamas e a meditação, por exemplo.



YV – Ashtanga Yoga, “never more”? Ou você ainda pratica de vez em quando?

 LU – “Never more” eu não diria. O Ashtanga foi super importante num determinado período da minha vida. Me trouxe, em termos da relação com o corpo, energia e disposição, exatamente o que eu precisava naquele momento. Sabe que recentemente, depois de anos, resolvi fazer, durante alguns dias, a primeira série de Ashtanga. Foi interessante reviver a sensação forte de energia que o ritmo dessa prática te traz. Mas confesso que fiz algumas adaptações, como por exemplo, fazer o sarvangasana e o halasana com cobertores embaixo dos ombros e cinto nos cotovelos.



YV – Na prática pessoal seja do professor de Yoga ou do praticante, a tendência é repetir os ásanas que se gosta mais de executar. Na sua prática pessoal você tem um ásana preferido? E, você costuma adicionar uma nova postura a cada prática para investigá-la com maior profundidade?

LU – Sim, é preciso ficar atento a isso quando se pratica sozinho. A tendência é ficar na zona de conforto. Penso sempre sobre isso, e tento me propor a praticar os ásanas que me exigem mais. De uma maneira geral, as flexões para a frente são posturas cuja execução e permanência acontecem para mim de forma fácil. E, por isso mesmo, por gostar delas, tenho que ficar atenta pra não cair no exagero nesse grupo de ásanas. De tempos em tempos trago para minha prática aquelas posturas que não me saem tão facilmente, que exigem de mim mais esforço, perseverança e paciência até se tornarem mais fluidas e confortáveis.




YV – O que a inspira a continuar a sua trajetória pelo caminho do Yoga? Você acha que há muitas pessoas que param no meio, desistem da jornada e nunca mais querem ouvir falar sobre Yoga? Por que isso acontece?


LU – Sim, conheço pessoas que algum momento da sua vida se encantaram com o Yoga e depois se desconectaram totalmente. Não sei, talvez a pessoa não tenha encontrado no Yoga o que ela buscava ou tenha achado difícil colocar em prática o que o Yoga propõe, como deixar de agir de forma condicionada, fazer escolhas conscientes, viver de forma mais simples, questionar padrões de comportamentos que com um pouquinho de discernimento se mostram claramente prejudiciais. Eu, realmente, encontrei no Yoga e no Vedanta as respostas que busco. Estou absolutamente satisfeita com esses meios de conhecimento que me levam a conhecer e compreender a verdade sobre mim mesma.E muito grata por tudo o que aprendi e tenho tido a oportunidade de vivenciar a partir desse olhar.






LUCIANA GUERIN

Em busca do entendimento sobre o meu propósito de vida, encontrei no Yoga o caminho para o autoconhecimento, para me libertar dos condicionamentos e ter uma vida mais plena, feliz e em paz. Conheci o Yoga em 1990, aos 20 anos, quando cursava a Faculdade de Jornalismo em Campinas, interior de São Paulo. Paralelamente à carreira de jornalista, o Yoga se tornou um caminho de transformação. Trouxe mais luz, consciência, vitalidade e contentamento. Interessada em aprofundar os meus conhecimentos, fiz cursos com diversos professores. Entre eles, Pedro Kupfer, com quem, além de participar de vários workshops, fiz a Formação Para Professores e uma viagem de estudos para a Índia, em 2005. Também estudei com Camila Reitz, Marco Schultz, Renato Turla, Laurent Dauzou, Faeq Biria, Maria Jesús Lorrio Castro, Gustavo Ponce, entre outros.  Pratiquei Ashtanga Vinyasa Yoga com Regina Ehlers. Com ela, fiz ainda o Curso de Formação Para Professores, em 2005. Com Kálidas Nuyken, pratiquei regularmente Iyengar Yoga e frequentei, em 2006, 2007 e 2010 o Curso de Formação Para Professores. Em 2009, morei em Buenos Aires, na Argentina, onde pratiquei um ano com a professora Sênior de Iyengar Yoga, Marina Chaselon.  Após 15 anos de atuação na área jornalística, em 2006 passei a me dedicar exclusivamente ao Yoga, estudando e ensinando. Desde então, tenho sentido imensa realização e alegria em compartilhar as minhas experiências com o Yoga. Há cerca de um ano abri meu próprio Espaço de Yoga, o Sitaram Yoga, que fica na Vila Madalena, em São Paulo.

www.sitaramyoga.com.br

facebook: Sitaram Yoga Luciana Guerin

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As FOTOS dos ásanas foram feitas por Luis Esnal e Claudia Tavares; agradecimentos, ficaram ótimas!



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