HUMBERTO MENEGHIN
Quando o ano começou fomos surpreendidas com uma
notícia bombástica no escritório: uma nova sócia foi admitida e conforme
buchichos soubemos que ela é uma pessoa muito difícil de se conviver. A
Claudinha disse para não colocarmos a carroça na frente dos bois, pois um amigo
dela, que já trabalhou com a tal mulher, disse que no fundo ela é uma boa
pessoa, mesmo que seja muito exigente com os que com ela trabalham e
extremamente viciada em trabalho.
Seu nome era Valquíria; muito bem apessoada e
demasiadamente elegante, trajava um terninho preto bem confeccionado e usava
muitas jóias, jóias de primeira qualidade: vários anéis pelos dedos, uma
pulseira de ouro maciço com pedras semi-preciosas e brincos, tudo dentro da
mais perfeita elegância.
Na casa dos cinqüenta, bem penteada, possuía a
testa grande e os olhos amendoados. Logo que nos foi apresentada pelo chefe,
solicitou que alguém fosse buscar uma caixa com suas coisas em seu carro; e,
então, eu fui a escolhida.
Quando a mulher me deu as chaves do veículo notei
pelo chaveiro que se tratava de uma Mercedes, que chique! Nunca havia sequer
colocado os pés num carro desses. Então, fui até a garagem, no subsolo e
localizei a mercedes da mulher, da cor prata, estacionada numa vaga, bem ao
fundo. Acionei o chaveio e o carro se abriu. Suas coisas estavam mesmo numa
caixa no banco traseiro e dentro percebi que havia algumas pastas, livros, cds
de Frank Sinatra, outros de jazz e MPB e ainda um tapetinho para pratica de
Yoga da cor verde limão. Será que ela é uma praticante assídua? Não me pareceu,
mesmo passando a imagem de estar em ótima forma.
Enfim, voltei para o escritório e quando deixei a
caixa na sala dela, Valquíria me perguntou o que aquele tapete de Yoga estava
fazendo ali junto com as suas coisas. Eu, então, disse que ele já estava lá; e,
num ímpeto ela me ordenou de volta para jogar fora aquela “porcaria” e ainda
reclamou do café, pedindo uma nova garrafa com um bem feito.
Voltando para minha mesa, imediatamente pedi para
prepararem um café caprichado para a madame e decidi não jogar fora aquele mat,
deixando-o ao lado da minha mesa. A Claudinha se aproximou e me disse que
Valquíria havia convocado uma reunião para ao começo da tarde, após o almoço;
que ela e o chefe iriam anunciar algumas mudanças. Mudanças?! Que mudanças
seriam essas? Não gosto disso! De mudanças.
Fomos almoçar e durante o almoço comentei com a
Claudinha que havia encontrado um mat
junto com as coisas de Valquíria, dentro daquela caixa e que ela me pediu que
jogasse fora. Juro que não entendi isso e, então, a Claudinha deduziu que ela
deveria ter praticado Yoga por algum tempo e não ter gostado; só poderia ser
isso.
Voltamos para o escritório e por nossa surpresa, a
nova sócia estava sentada na minha mesa, falando ao celular com alguém. Quando
nos viu, apontou o indicador para aquele tapetinho que eu não tinha jogado
fora.
Entendendo a mensagem, imediatamente peguei o mat
e com grande dó joguei-o numa lixeira, enquanto Valquíria se levantava e
retornava para sua sala ainda falando ao celular.
Fiquei muito intrigada por encontrá-la ali na minha
mesa durante a minha ausência. Será que ela havia mexido em alguma coisa?
Aparentemente, não. Mas, deve ter dado uma olhada, com certeza. Então, notei a
menina da limpeza recolhendo o lixo, pegando o mat e separando-o,
dizendo que iria levar para casa aquela passadeira que tinham jogado fora.
A tarde passava e aquela reunião onde seriam
anunciadas as “mudanças” já acontecia a mais de uma hora na sala de Valquíria.
Então, quando faltavam vinte minutos para o expediente terminar, a Claudinha, o
chefe e mais uma outra pessoa do alto escalão deixaram a sala da nova sócia,
quase todos dando risadas. Sem querer
meus olhos estacionaram sobre aquele livro de capa vermelha que a Simone havia
emprestado para a Claudinha, que estava sobre a mesa dela: “The problem is
you, the solution is you”, aquele livro que haviam insistido para que lesse
a tradução disponível no site www.yoga.pro.br
, mas que ainda não li. Então, notei a Claudinha, acomodar-se ao meu lado e
contar sobre o teor da reunião.
Ouvia atentamente, concluindo que a nova sócia
certamente estava lá para cobrar produção e mais eficiência de todos. Então, notei
a Claudinha silenciar-se e depois dizer, meio sem jeito, que Valquíria iria
trazer uma nova funcionária para trabalhar na empresa e que essa nova
funcionária iria ocupar o meu lugar.
Fiquei estarrecida com isso! Como alguém poderia
fazer uma coisa dessas comigo! Uma funcionária exemplar e muito dedicada que
jamais merecia ser rebaixada! Pensei em falar com o chefe e até mesmo com
Valquíria, mas a Claudinha disse que isso não iria adiantar, porque já haviam
decidido, pois a nova funcionária já iria começar no dia seguinte. Então, ainda
fiquei sabendo que iriam me mudar para ouro andar, para um departamento
horrível onde poucos gostavam de trabalhar.
O expediente acabou e mesmo tendo aula de Yoga, em
poucos minutos, havia perdido totalmente a vontade de praticar. Sentia-me muito
para baixo, desanimada e cheia de raiva, com o que haviam feito comigo no
escritório. A Claudinha tentou me
reanimar, me elogiando, dizendo que eu era uma ótima funcionária, mas isso não bastava.
Insistiu para que fosse com ela para a prática de Yoga, pois iria fazer bem
para mim. Contudo, não aceitei e fui para casa chorar; para mim, nesse dia não
teve aula de Yoga.
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