HUMBERTO MENEGHIN
artigo publicado originalmente na revista Prana Yoga Journal, como colunista convidado (edição 33, outubro/2009) - Fotos pelo autor: Dolomitas - Itália
Imagine que a sua frente há uma bela e majestosa montanha, com o pico nevado, árvores, riachos a sua volta. Para chegar até ela, existe uma trilha.Você decide ir. Com você estão um guia e outras pessoas com o mesmo desejo. O começo se mostra fácil, demandando até certo nível de concentração e esforço físico.
Vocês param para descansar, absorvem o prana e se sentem bem. Você sabe de pessoas que já chegaram ao cume da montanha e com os outros continua seguindo pela trilha, que agora se mostra tortuosa, com buracos e relevo disforme.
Mais à frente, a dificuldade da trilha que bem poderíamos nominá-la, caminho do Yoga, é sentida por vocês. Persistindo, apesar da transpiração e certos efeitos no físico, todos continuam até avistarem um riacho com quedas d’água.
Novamente todos absorvem o prana e o guia sugere que parem para descansar. O tempo passa, seu corpo e mente sentem-se bem mais leves do que o normal e em certo momento o guia aumenta o tom da voz e diz que já está na hora de se levantar e retornar. Mas, você é invadido por uma imensa vontade de continuar em frente, e seguir em direção à montanha, onde a paisagem é maravilhosa.
Então, você pergunta ao guia: “Podemos continuar pela trilha até o topo da montanha?” Subitamente, o guia que até então estava conduzindo o grupo por aquela trilha, diz que o caminho à frente é difícil, que não vale a pena atravessar a ponte sobre o riacho diante daquelas condições. E, de modo persuasivo, ordena a todos que voltem imediatamente. E, ainda sugere que, se quiserem que os leve ao topo da montanha em outro dia, não garantindo que cheguem, devem pagar um extra a mais para esse novo passeio.
Alguns contestam aquela decisão e expressam a vontade de seguir em frente; mas, temem ir sozinhos, sem o apoio de um guia que tanto confiam. Outros nem isso pensam, sentem-se maravilhados por terem chegado lá e não medem elogios ao guia, que merece uma boa gorjeta por ter feito as pessoas sentirem tão bem à beira do riacho, sem ao menos perceberem que, além do riacho, do outro lado da ponte, se seguissem pela trilha até o topo da majestosa montanha, poderiam se sentir melhor ainda.
No entanto, todos começam a retornar por onde vieram; alguém se vira e percebe um pequeno grupo que vem descendo pela trilha, atravessando de volta por aquela pequena ponte sobre o riacho e aproveita para dizer ao guia: “Olhe! Eles estão voltando. Devem ter chegado ao cume da montanha”. E o guia, responde: “Não vale a pena, já disse, todos ficarão exaustos.É pura perda de tempo.Vamos voltar que já está ficando muito tarde”.
Não contente com a resposta do guia, esse componente do grupo, diminui os passos, fica por último e espera que aquelas pessoas que parecem ter atingido o cume se aproximem. Elas chegam mais e ele pergunta: “Vocês atingiram ao topo? Como foi?”
Um deles responde: “Exigiu um pouco do físico, da respiração e até mesmo da concentração para não sair e escorregar pela trilha ou cair em buracos. Descansamos um pouco, sim, nos desligamos, mas atingimos o cume. Não é difícil, todos podem conseguir.”
Querendo saber mais, o curioso pergunta: “E como foi sentir-se lá em cima, no topo da montanha?”
Outra componente do grupo respondeu: “Foi extremamente válido, desliguei-me de tudo, me senti em plenitude. Por que você não continuou pela trilha e já está retornando?”
O interessado respondeu: “É porque o guia nos levou somente à beira do riacho; disse que não valia a pena continuar, que não teríamos a paciência necessária para seguir, que o caminho seria muito difícil. E que, se quiséssemos ir um outro dia, teríamos que pagar um valor a mais”.
“Que pena!”– disse o primeiro componente do grupo. “Amanhã iremos fazer esta trilha de novo. Se quiser vir com a gente é só nos encontrar no início, próximo às placas, bem cedo. Ficaremos felizes em ajudar você a seguir por esta trilha até o topo da montanha”.
A estória acima ilustra nitidamente, de uma forma análoga, a importância da meditação na prática do Yoga. O primeiro grupo, que é o dos praticantes que seguiam pela trilha com um guia, ou seja, o professor de yoga, após percorrerem o caminho, exercitando e ativando o físico, em asana, transpirando, respirando e finalmente parando para relaxar junto ao riacho, não transpôs a ponte.
O guia/professor desencorajou os que estavam sob a sua guarda a seguirem pelo caminho da prática meditativa, ou seja, desestimulou os alunos a treinarem a concentração, dharana, e a desenvolverem a persistência para chegarem ao topo, ou o dhyana, a meditação.
Por sorte, um dos componentes “daquele grupo” após questionar o guia, que preocupado estava em retornar ao início para guiar outro grupo, ou seja, ministrar uma nova aula de Yoga, encontrou praticantes, que não só de asana, pranayama e relaxamento viviam, pois tinham como fim precípuo utilizá-los como suporte para atingirem o estado meditativo.
Toda boa prática de Yoga que se preze, não é somente composta pela execução de asanas, pranayamas, relaxamento e/ou Yoga Nidra. Momentos antes de a aula se encerrar, não custa nada reservar alguns minutos às técnicas de concentração com o fim de conduzir o praticante a um estado de meditação.
No entanto, sabemos que alguns professores não dispensam a devida importância a esse ponto crucial do Yoga e simplesmente abolem a meditação das aulas. Mas por que isso acontece, se asanas, pranayamas e o relaxamento são elementos que servem como fios condutores à meditação? Seria pela mera falta de preparo do próprio professor de Yoga? Ou seria por razões logísticas de certos espaços de Yoga, que assim pontuam e preferem reduzir os horários das aulas justamente para terem mais turmas disponíveis com o fito de aumentarem o faturamento?
Em contrapartida, outros espaços oferecem um horário para a prática de meditação, à parte da prática do Yoga, tendo os interessados de pagarem um adicional se quiserem meditar.
Ora, por aí você pode perceber que quando o praticante está pronto e desperto, aparecem amigos e outros professores que praticam o Yoga por completo com o fito primordial de moksha, a liberação e que de modo algum abolem a prática da concentração e meditação de suas aulas.
Já para aqueles que satisfeitos estão em apenas chegar à beira do riacho, quem sabe um dia possam se despertar e seguir, por si só, pela trilha da montanha até atingirem o topo.
E para aquele “guia” que tão somente está orientado a chegar com o grupo às proximidades do riacho, para depois pegar um outro grupo e fazer o mesmo ou até cobrar um adicional para auxiliar seus alunos meditarem, reflita bem se não está na hora de mudar este conceito.
Não precisa querer de imediato chegar até o cume como os trekkers mais experientes já fazem, mas seguir pelo caminho aos poucos, semeando a terra para a colheita dos frutos, pois, ao quebrar o padrão de terminar a prática do Yoga apenas com o relaxamento e passar a adotar a meditação, nem que seja por dez minutinhos, fará uma grande diferença a você e a seus alunos.
Harih Om!
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