HUMBERTO MENEGHIN
YV –
Muitas pessoas que a conhecem e a admiram sabem que neste ano de 2013 você
retornou à Mysore, Índia para mais uma temporada de estudo e prática de Ashtanga Vinyasa Yoga e após algumas
idas e vindas você agora recebeu a autorização oficial da família Jois
confirmando que está muitíssimo apta a ministrar a prática de AVY até a série
intermediária. O que esta conquista significa para você considerando todos
esses anos de práticas e descobertas? A Dany Sá que nós conhecemos e admiramos
continua a mesma de sempre ou alguma coisa mudou com essa conquista? E, se algo
mudou, o que foi?
DANY – Receber esta autorização oficial foi
uma benção, um reconhecimento do lugar a onde nasceu o Ashtanga. Tudo isto foi
fruto da minha dedicação e devoção a esta prática. Nada mudou dentro de mim,
mas só aumentou mais ainda a minha devoção e a minha responsabilidade de seguir
no meu caminho de práticas e ensino seguindo a tradição original.
YV – De
acordo com um post em seu blog, você relata como é o seu dia a
dia em Mysore; desde acordar duas horas mais cedo antes de a shala abrir para depois como instrutora
assistente auxiliar os alunos na prática, ajustando-os. Ajustar cada praticante
num determinado ásana, além de se ter
uma experiência prévia esse ato denota muito cuidado por parte de quem aplica
os ajustes. Cada corpo é diferente um do
outro e de que forma um ajuste necessário irá levar o praticante a se sentir
firme e confortável no ásana? Dentre
os diversos ajustes disponíveis quais você acha os que demandam mais atenção e
cuidado por parte do professor? Será que nas práticas de AVY que nos deparamos
por aí, em especial no Brasil, os professores e professoras estão ajustando
corretamente seus alunos ou isso acaba por passar batido e não se ajusta, visto
que ainda há muitos professores inexperientes que ainda não sabem aplicá-los?
DANY – Minha rotina no mês de novembro foi
bem intensa mesmo, pois além de manter minha prática diaria, tive que antes
ajustar muitos alunos que nem havia antes conhecido. Procurei ouvir minha
intuição para ajustá-los e quando necessário perguntava se estava tudo bem. Como
eram muitos alunos, não tinha como dar muitos ajustes. Por isso os ajustes
foram mais específicos e em determinadas posturas como marichyasana D, supta
Kurmasana, kapottasana, back bendings..
.
É
importante ter muito cuidado e ter a sensibilidade para saber o que realmente
cada aluno precisa.
O
ajuste não significa que você precise forçar um aluno e sim conduzí-lo a um
caminho seguro para realizar o asana. Este ajuste pode ser sutil através de um
ajuste corporal ou até mesmo através de um comando verbal. Também é importante
que depois de algumas vezes ajudando, o professor deixe o aluno encontrar seu
próprio caminho para realizar a postura.
O
mais importante para se fazer um bom ajuste, principalmente um mais complexo, é
ter tido a experiência de praticar esta
postura. Se um professor se sentir inseguro em realizar um ajuste em alguma
postura que ele não conhece, sugiro que ele não o faça. Será muito mais seguro
e sincero da parte dele eo aluno irá gostar mais.
YV –
Após o encerramento de cada prática como assistente de Sharath Jois, encontrar
fôlego e ânimo suficientes para realizar a sua prática pessoal demanda muita
força de vontade e inspiração? Quais ásanas
tanto da primeira e segunda séries você sentiu que pediram mais atenção para
você atingir a perfeição? E por falar sobre essas séries, em que elas diferem
entre si e quais são os benefícios que o praticante colhe em cada uma delas? Você
teve o privilégio de estudar novamente com Sarasvati Jois?
DANY – Antes de iniciar o mês de ajustes,
fiquei pensando que não seria fácil fazer a minha prática depois de ajustar
tantos alunos por duas horas... Mas para minha surpresa, foi muito bom! A troca
de energia com os alunos me deixava com mais força e determinação. Além disso,
eu também ja estava bem aquecida e os asanas saíam com mais facilidade. Para mim a perfeição no asana é quando você
consegue atingir um estado meditativo e consegue estar realmente conectado com a
postura e a respiração. Neste momento não existe esforço. Para isso, sempre
penso em manter minha respiração num ritmo lento, suave e profundo, com isso a
mente vai se tornando estável, diminuindo os vrittis (ondas mentais). Para mim a prática de ashtanga é uma
prática respiratória. A sincronização da respiração com a postura, o que
chamamos vinyasa, faz o sangue
circular com mais intensidade por todo o corpo produzindo calor e assim
purificando-o e elimando as toxinas.
Cada
série do ashtanga tem seu beneficio físico. A Primeira série também é chamada
de Yoga terapia (yoga chiktisa), pois
purifica todos os orgãos do corpo, melhorando seu funcionamento. A Segunda
série (Nadi sodhana), purifica todo
coluna vertebral, ativando o sistema nervoso central. As séries avançadas já
precisam estar com o corpo mais purificado para realizá-las, pois são sequências
de asanas mais complexos.
Quando
se chega nesta fase, realizar estas asanas mais avançados requer muita
disciplina, dedicação e devoção. Neste momento o praticante percebe que o seu
corpo pode ultrapassar alguns limites físicos, mas que isso realmente não é o
mais importante. Todas as séries tem o mesmo objetivo; fazer com que o
praticante consiga perceber sua verdadeira natureza e real sentido do yoga que
esta dentro dele.
Este
ano não tive a oportunidade e a benção de praticar com a Saraswati, pois agora
ela tem seu próprio shala e ela não
esta mais ajustando com o Sharath.
YV –
Quais as qualidades essenciais que devem estar presentes num professor ou
professora de AVY comprometido com a prática que ao longo do tempo podem
conduzi-lo a uma certificação concedida pela família Jois? E, após
certificar-se é comum que ocorra um afastamento desse professor ou professora da
senda do Ashtanga ou sempre há um retorno à Mysore, mesmo que seja em um
período de tempo mais espaçado? Então, quer dizer que após a Terceira Série
acabou o Ashtanga ou existem outras mais a serem conhecidas e praticadas?
DANY Para ser um professor comprometido com a
prática precisa ter disciplina, dedicação e devoção. Por isso o praticante
precisa vir algumas vezes à Mysore para criar este vínculo e embasamento na sua
prática. Todo resultado necessita de um esforço e entrega. Por isso esta
autorização ou certificação é concedida quando o Sharath percebe este qualidade
em seus alunos. É importante lembrar que praticar ashtanga é seguir os oito
passos do Yoga como a palavra ashtanga já
diz. Praticar yoga em todos os aspectos, ter ética seguindo os yamas e nyamas. O professor precisa ter a disciplina, ter o seu sadhana, prática diária 6 vezes por
semana e devoção aos seus mestres que manteram a tradição até os dias de hoje.
Só assim ele conseguirá transmitir a verdade para seus alunos. Cada vez percebo
que vir a Mysore, é muito mais do que vir com um objetivo de certificação, é
estar aqui em busca de conhecimento e aprendizado, mantendo o contato com
professor e buscando nele toda energia necessária para continuar no caminho.
Alguns professores certificados se afastaram de Mysore, pois tinham Pattabhi
Jois como seu guru, alguns certificados continuam vindo a Mysore anualmente
continuar seus estudo com Sharath. Isso vai depender de cada um. O ashtanga não
acaba nunca! Ashtanga yoga é uma prática para toda a vida independente de qual
série você está realizando. Mas falando da sequência de asanas são seis séries fixas, mas poucos chegam até lá...
YV –
Nos Estados unidos, sabemos que as crianças em idade escolar em certas escolas
são contempladas com a prática de Yoga e numa escola em Encinitas, CA, elas
praticam Ashtanga. Diante disso houve uma controvérsia visto que alguns pais de
alunos começaram a entender que Yoga é religião é por isso as aulas deveriam
ser canceladas em
definitivo. Esse assunto chegou a ponto de ser levado à Corte
Judicial e por fim um magistrado decidiu que não há nada de religião na prática
de Yoga, em suma, Yoga não é religião. No entanto, muitos professores incluem
mantras e cultos a certas deidades do Hinduísmo em suas aulas de Yoga. Então,
Yoga induz ao Hinduísmo ou isso é pura lenda? E, essas crianças que praticam
desde cedo, você acha que elas poderão ter um futuro diferente daquelas que não
adotam a prática regular? Há chances de no Brasil as escolas adotarem a prática
do Yoga no currículo ou isto está longe de ser verdade, pois pé na bola é o que
vale mais, ou seja, futebol?
DANY – Como a palavra yoga já mesmo diz, Yoga
significa união, religar, juntar... Na India o Yoga é visto como religião, pois
esta é a forma de eles se conectarem com Deus.
Mas se a pessoa não nasceu na India e não é hinduísta, ela pode praticar
Yoga e utilizar outras ferramentas que a prática oferece para fazer esta
conexão com Deus e com sua própria natureza. Você pode ter adoração por alguma
deidade indiana, mas nem por isso você virou hunduísta. Por isso acredito que a
prática de Yoga para crianças nas escolas seria muito bom para elas desenvolverem
tranquilidade, atenção e auto-observação. Algumas escolas no Brasil ja oferecem
Yoga na sua programação e ja é comprovado que os resultados são sempre
produtivos. Mais que um atividade esportiva como o futebol, vejo que o Yoga é
uma filosofia de vida, então uma coisa não compete com a outra.
YV –
Alguns instrutores de Yoga ditos “tradicionais” ainda alimentam um certo
preconceito em relação ao AVY e um deles é que praticar Ashtanga é fazer
ginástica que visa perder calorias. O que você poderia dizer para os que
alimentam essa ideia e ainda procuram a todo custo defender essa premissa
perante uma pequena platéia para no fundo chamar a atenção a si mesmo?
DANY – Para quem pensa que praticar ashtanga
é fazer ginástica e perder calorias é porque nunca praticou ashtanga de verdade... Acho que todas as modalidades de yoga têm
seus benefícios específicos, mas o caminho final é um só: Yoga, libertação.
Por
isso não tenho preconceito com nenhum tipo de yoga, aliás “ preconceito” não combina com uma pessoa que se diz praticante
de yoga, você não acha? Cada um pode
ter tido o seu motivo pessoal por não gostar de um estilo de prática, mas nem
por isso ele precisa falar para os outros sua experiência como sendo a única
verdade. O que é que eu sei é que quem pratica ashtanga está muito feliz e bem
resolvido no seu caminho de aprendizado e por isso não está preocupado com que os outros dizem.
YV – Uma praticante de AVY recebeu a notícia que está grávida. O bom senso pede para que a grávida não pratique Ashtanga? Ou se o médico der um aval ela poderá seguir com a prática normalmente? E, em assim sendo, certas posturas devem ser adaptadas ou até abolidas da série? No entanto, outro fato poder ocorrer: a professora ficou grávida. Ela restringe-se apenas a conduzir verbalmente a prática?
DANY – De uma maneira geral, é indicado não
praticar nos três primeiros meses, pois é o momento que o embrião está se
formando e pode haver alguma complicação, mas cada caso é um caso. Depois dos
três meses, a grávida pode voltar à prática mantendo algumas restrições na
série, algumas posturas podem ser adaptadas e com ao passar da gestação,
algumas posturas realmente não serão mais feitas, como posturas de força
abdominal, torções... Mas vejo que a
mulher grávida tem sua própria intuição e sabe bem aquilo que é confortável ou
não. Algumas grávidas ficam com muita energia e tem necessidade de fazer uma série
mais energética (já vi uma grávida fazendo a segunda série e super bem!), outras
já sentem vontade de fazer uma prática mais restaurativa e meditativa.
No
caso de uma professora ficar grávida, ainda não tive essa experiência
pessoal... mas, pretendo ter futuramente!
Acredito que a professora pode fazer ajustes, mas deve evitar fazer
ajustes muito fortes e conduzir a aula naturalmente usando o bom senso.
YV – Um
praticante de AVY mergulhado na primeira série encontra certas dificuldades em
realizar alguns ásanas, dentre eles: marichiásana D, bhujapidásana e supta kurmásana,
pois seu corpo parece não se encaixar corretamente nas posturas. De que forma o
professor pode ajudar esse aluno a continuar no caminho da prática sem que
surja qualquer indício de uma desistência? Será que um dia os pés se
posicionarão onde devem ao se executar supta
kurmásana?
DANY – No ashtanga existem posturas mais
desafiadoras e mais complexas que se encontram no meio da série e que
necessitam que o aluno pare naquela postura por algum tempo para entender o
processo do seu corpo e sua mente. Mais do que a parte física, estas posturas
estão trabalhando com o psicológico: com os medos, insegurança, aceitação,
entrega... É natural que com o tempo a postura vá se tornando mais fácil e o
professor orienta a próxima. Uma postura prepara para outra. Quando o aluno se
torna forte numa postura, a próxima será realizada com mais facilidade e
segurança. O professor precisa orientar seus alunos para que eles tenham paciência
e que o mais importante é a qualidade que é colocada na sua prática e não a
quantidade de posturas. Os pés podem se posicionar algum dia na posição
correta, isso vai depender da frequência do aluno nas aulas e de sua atitude
interna ao praticar, mas também se não acontecer por alguma limitação física,
está tudo bem também, isso não é o mais importante.
YV –
A primeira prática de Ashtanga Vinyasa Yoga parece ser bem marcante para os
marinheiros de primeira viagem. Muitos se frustram e desistem, pois a professora
ou professor foi muito tirano, ou seja, forçou-os muito durante a aula. Por
outro lado, alguns outros praticantes têm a sorte de encontrar pela frente uma professora
ou professor bem formado onde o bom senso acaba prevalecendo e então esse
praticante se apaixona pelo Ashtanga e se torna um praticante fiel. Como o novo
aluno deve ser recebido quando se depara com a prática pela primeira vez no
sentido de não se criar um “trauma”? O que você acha de certos professores que
nivelam os praticantes, ou seja, tratam os novatos como os que já estão há
certo tempo praticando?
DANY – Acredito muito na tradição e como o
método é ensinado na Índia que é o chamado
“estilo Mysore”, prática pessoal. Numa primeira prática de ashtanga, o
professor deve sentar o aluno, explicar como funciona o método de aprendizado e
ensinar o primeiro passo que é a respiração ujjayi pranayama. Depois disso o professor ensina o surya namaskar A e talvez o suryanamaskar
B dependendo da evolução e nível de aprendizado do aluno. A aula geralmente
vai até esta parte e com o passar das aulas o professor vai acrescentando
postura a postura. Acredito que assim o aluno vai criando confiança e
embasamento na prática. Agora, se um
aluno inciante cair de pára-quedas numa aula guiada e tentar fazer toda a série
num único dia, é bem provavel que ele fique asssutado e não volte mais e aí sim
poderá gerar um trauma. Mesmo dentro de
uma aula guiada, acho importante o professor direcionar os alunos inciantes a
fazer a prática até onde seu corpo e seu
fôlego podem sem forçá-los e deixar que eles respeitem o seu prórpio ritmo.
YV – Bons momentos e lembranças fazem parte da vida de qualquer ser humano. Que bons momentos e lembranças ainda permanecem durante todo esse caminho em que você está trilhando no Ashtanga Yoga? E, se você pudesse se encontrar com Pattabhi Jois, mesmo que fosse durante um sonho, o que você diria para ele?
DANY – Muitos bons momentos e lembranças eu
tenho desde o momento que comecei a praticar yoga, de todos bons professores
que encontrei neste caminho e que muito me ensinaram. Cada momento neste
processo tem sido úncio e importante, como a sensação quando eu termino cada workshop que é muito especial, meus
alunos me inspiram e me ensinam a cada dia também. Eu só tenho que agradecer esses bons
momentos!
Se
eu pudesse encontrar o Pattabhi Jois... seria um sonho maravilhoso! Eu só me
curvaria aos seus pés com muita devoção e gratidão por ter colado esta prática
em meu caminho!
YV
– 2014 é o ano da Copa do mundo no Brasil, você já conta com uma agenda planejada
e específica para práticas e workshops?
O que vem por aí na Vida de Yoga de Dany Sá?
DANY – 2014 será um ano de muitos projetos,
alguns deles já estão planejados e agendados como workshops por todo o Brasil no primeiro semestre e o segundo curso
intensivo na Montanha Encantada, em Garopaba. Também pretendo manter um
programa de aulas regulares no Rio de Janeiro ainda por definir algumas coisas.
Novo site, novo vídeo... também estão
por vir! Aguardem!
Leia a primeira entrevista
concedida pela Dany ao YogaemVoga: http://yogaemvoga.blogspot.com.br/2013/03/yoga-em-voga-entrevista-dany-sa.html
DANY SÁ – Bailarina formada pela faculdade de Dança (UniverCidade-
RJ), 1998. Pratica e estuda a filosofia do Yoga desde 2002. Fez o curso de
formação de professores com o professor Pedro Kupfer em Florianópolis, SC,
(módulo I -2005 e módulo II- 2008.) Em 2006 iniciou sua prática regular de ashtanga
yoga no Rio de Janeiro com o professor Matthew Vollmer e ampliou seus estudos
com o professor Clayton Horton em São Francisco – Ca, sendo também sua
assistente nas aulas de ashtanga.
Tem aperfeiçoado seus estudos no
Ashtanga Yoga Institute (KPJYAI), Mysore, India com os professores Sharath Jois
e Sarawasthi Jois, tendo também aulas de Cânticos Vêdicos, Sânscrito,Bhagavad
Gita e Yoga Sutras com o prof. Lakshmish.
Em novembro de 2013 foi
assistente nas aulas do seu professor Sharath Jois e recebeu a benção de ser
professora autorizada nivel 2 a ensinar o método.
Tem a sua prática de ashtanga
como filosofia de vida e acredita que através da prática de yoga, o ser humano
vai buscando autoconhecimento e tornando-se uma pessoa melhor e mais feliz.
Site: www.danysa.com.br
Intensivo de Ashtanga Yoga / 2014: http://yogaencantada.web761.kinghost.net/blog/calendario/ii-intensivo-de-ashtanga-yoga-2/
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