24 de novembro de 2011

MINHA AMIGA PRATICA YOGA, EU TAMBÉM! – PARTE SEIS



HUMBERTO MENEGHIN


Quando cheguei ao escritório todos notaram meus novos óculos escuros; até a menina da limpeza me elogiou dizendo que fiquei muito bem com eles e que gostaria de ter um igual, que na verdade são idênticos ao da Claudinha, da mesma marca. Parecemos irmãs quando saímos juntas para almoçar usando nossos óculos mais do que charmosos, me sinto outra com eles.




No início da tarde, quando retornamos do almoço, o Dárcio passou por mim trazendo uma pequena cesta com vários papeizinhos dobrados: era a minha vez de saber quem seria meu amigo ou amiga secreta. Fiz o sorteio, desejando, é claro, tirar a Claudinha; mas quando desdobrei o papel e li o nome de quem era, me decepcionei tanto; não era a Claudinha, mas sim o chefe.




Passei o dia todo tentando imaginar o que o chefe gostaria de ganhar como presente de amigo secreto; na minha situação teria que dar algo muito bom. Quem será que me tirou? Quem seria o amigo secreto da Claudinha? Depois, o Dárcio colocou a mesma cesta, agora vazia, próxima à mesa do cafezinho para deixarmos bilhetinhos e outros mimos para os nossos amigos secretos. Espero que ele não tenha me tirado. Detestaria saber que o Dárcio me tirou como amiga secreta.

Pois é, me pediram tanta coisa que no fim do dia me sentia extremamente exaurida, contando os minutos para irmos para a nossa aula de Yoga. Então, dei por falta dos meus óculos, dos meus lindos óculos escuros. Não conseguia achá-los em parte alguma. Não estavam na minha bolsa, não estavam sobre a minha mesa; não tinham ficado sobre a pia do toalete; nem pendurados na minha blusa, nada. Nenhum sinal dos meus preciosos óculos. Cadê eles? Rodei o escritório todo, até pela máquina de fotocópias procurei, mas não os encontrei. Foi então que um pensamento me veio á cabeça: a menina da limpeza gostou tanto dos meus óculos que eu desconfio que ela os tenha levado. Será? Acho que não. Ela não seria capaz de levar um objeto de outra pessoa ... não sei.




Onde será que estão os meus óculos? Paguei tão caro por eles. Seria uma lástima perde-los assim. Sem querer, uma luz me passou pela cabeça: eu só poderia ter esquecido os meus lindos óculos lá no restaurante, em cima da mesa onde almoçamos e na certa a dona Li, proprietária do restaurante, os guardou para mim, é claro. Liguei para lá e como resposta a dona Li me disse que os meus óculos também não estavam por lá. Fiquei tão decepcionada com isso!

Outro pensamento me passou pela cabeça: será que o Dárcio escondeu meus óculos? Uma vez ele escondeu o guarda-chuva de um colega que ficou procurando por toda parte, até que o ele, no fim do dia, o devolveu sobre a mesa do Alcir. Se o Dárcio escondeu os meus óculos ele vai se ver comigo. Se vai! Ele não me conhece! Já estou virando uma onça com tudo isso! Vai ter troco!

Só foi quando já estava na hora de irmos para o Yoga que a Claudinha, vendo que eu estava tão arrasada com alguma coisa, me perguntou o que estava acontecendo. Então, disse a ela que tinha perdido os meus óculos, que não os encontrava em lugar algum, que estava desconfiando que haviam levado embora. Que poderia ter sido a menina da limpeza ou o Dárcio quem os afanou. Então, a Claudinha esboçou um meio sorriso e me perguntou se eu já havia me olhado no espelho hoje.

Não entendi a pergunta, mas fomos juntas ao toalete e não é que os meus óculos estavam na minha cabeça! Tinham estado comigo o tempo todo, na minha cabeça e eu não me dei conta disso, achando que os havia esquecido em algum lugar ou que a menina da limpeza os tinha levado embora ou que o Dárcio os tinha escondido. Equivoquei-me feio com isso, desconfiando dos que não tinham culpa.

Respirei aliviada e ao mesmo tempo muito inconformada com a minha atitude e grande perda de tempo mental, sabendo que os óculos tinham estado comigo, com mais ninguém. Então, com cuidado os guardei na minha bolsa, para ficarem em segurança, para ninguém os levar embora, nem mesmo eu.

A tarde caiu tendo como pano de fundo um por de Sol maravilhoso que coloria todo o horizonte e é por causa desse espetáculo da Natureza que eu adoro o horário de verão, que possibilita essa contemplação.

Não demorou muito para chegamos ao espaço de Yoga, bem adiantadas, acho que vinte minutos antes de a aula começar, pois tivemos a sorte de pegar um trânsito fluído desta vez. Nos trocamos e já fomos direto para sala de prática. Lá me deitei sobre o meu tapetinho enquanto a Claudinha, sentou-se sobre o seu, em meio lótus, fechando os olhos, tentando talvez meditar. Então, passei a refletir sobre a equivocada atitude mental que tive no dia de hoje, aquela situação sobre os óculos que eu procurava, não achava, mas que estavam comigo o tempo todo. Que tolice!

Notei um barulho de vozes vir lá de fora e ficar mais próximo; parecia ser  alguns outros alunos que chegavam e se acomodavam para a prática. Ainda deitada, com os olhos fechados, ouvi o som de um tapetinho ser estendido ao meu lado, por alguém. Abri os olhos achando que fosse a Simone, mas não era. Tratava-se de uma mulher na casa dos quarenta, bonita, usando um top e uma calça bem folgada até a altura das canelas. Ao seu lado, um homem meio calvo e bem alto que também se acomodava para a prática. Conversavam entre eles e logo notei que tinham o sotaque do Rio Grande do Sul. Então, nosso professor chegou e logo foi conversar com esse casal sulista que, pelo o que captei, iriam fazer uma aula experimental.




Soube que eram de Porto Alegre, que tinham se mudado para cá e que o marido começou a trabalhar numa empresa multinacional, fabricante de uma importante marca de tablets que tinha acabado de se instalar numa cidade suburbana bem próxima a que moro. Edson e Soraia, esses eram os seus nomes.

Soraia me enviou um sorriso antes que a prática começasse e depois fechou os olhos unindo as mãos frente o peito para ouvir o mantra inicial, em forma de pergunta e resposta, que foi feito pelo nosso professor e por todos nós. De repente, notei a porta da sala se entreabrir e a Simone aparecer, chegando atrasada para a prática. Como de praxe se colocou à minha frente e me enviou um pequeno aceno deixando a sua bolsa ao lado da parede, acompanhada por alguns livros.

O casal que veio dos Pampas não parecia nenhum pouco leigo quanto à prática de ásanas, pois estavam executando as posturas com desenvoltura. Durante a execução do nauli, onde tenho muita dificuldade, percebi que Edson parecia engolir todo o abdômen para dentro em um movimento extremamente ondular, enquanto Soraia parecia fazer o mesmo, mas não com a desenvoltura do marido. Nossa! Mas o que é isso? Será que algum dia vou conseguir movimentar os músculos do meu abdômen desse jeito, como esse Edson faz?




No transcurso da prática até o encerramento, o casal longilíneo de Porto Alegre executou todos os  outros ásanas perfeitamente bem. Acho que nem precisariam se unir a nossa turma, pois  pareciam serem azes na prática de ásanas, talvez fossem até seres de um outro planeta, sempre optando pela versão mais difícil de cada postura.

Relaxamos, meditamos e a aula encerrou. O casal do sul trocou mais algumas palavras com o nosso professor e depois se foram. Lá embaixo, antes que fossemos embora, notei que ambos falavam com a recepcionista e ao que tudo indicava era que iriam se unir ao nosso grupo.

Eu e a Claudinha resolvemos tomar um pouco de chá, antes de irmos embora, para variar naqueles copos plásticos descartáveis que não aprecio muito. Simone se uniu a nós e sem querer meus olhos se estacionaram sobre a capa de um dos livros que ela tinha deixado sobre uma poltrona; o título estava em inglês e era: “The problem is you, the solution is you” – Swami Dayananda.




Notando o meu interesse, Simone perguntou se eu gostaria de levá-lo emprestado, mas frisou que teria que devolvê-lo, pois já estava cansada de emprestar seus livros e não os tê-los de volta. Não gostei dessa observação e então respondi que não queria o livro emprestado.

Simone não ligou sobre o que eu disse e decidiu emprestar o pequeno livro para Claudinha, que o aceitou e disse que o devolveria logo para ela. Bom, fiz bem recusar o empréstimo do livro, porque, primeiro, não sou boa em inglês, segundo porque não gostei nenhum pouco da exigência que a proprietária do livro me fez. Não entendo a Simone, às vezes é solícita e outras vezes tacanha. E, para não faltar, ela nos perguntou se estávamos fazendo aquele mantra para a Deusa Lakshmi que ela havia nos dado outro dia. Então, decidi mentir para ela e disse que estava fazendo o mantra todas as manhãs. A Claudinha, por sua vez, foi sincera e disse que ainda não havia começado.

O casal do Sul se uniu a nós para o chá e Edson, notando o livro da Simone que a Claudinha segurava numa das mãos, disse que já havia lido. Desenvolto, ele falou que o livro era muito bom e que nos possibilitaria refletir sobre aspectos e conceitos filosóficos do Vedanta. Então, ele nos contou um trecho do livro; um trecho que me chamou muito a atenção: aquela passagem em que um homem procurava os seus óculos por todos os lugares e não os achava e por fim os encontrou no topo da sua cabeça.

Fiquei estarrecida com a coincidência! A mesma estória tinha se passado comigo hoje e não pude deixar de contar a minha experiência para eles. Edson me disse que isso seria um chamado, um chamado para eu me dedicar ao estudo das escrituras... Mas que escrituras?




“Minha linda, você tem que ler esse livro.” – insistia Simone. Então, disse a ela que em inglês seria difícil.

“Não por isso, lindinha. O livro foi traduzindo para o português e publicado neste site:”


Harih OM! 

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